Luiza Trajano: conheça fatos inéditos da vida de uma das principais empresárias do Brasil

Visão da empresária guia livro “Luiza Helena - Mulher do Brasil”, de Pedro Bial

Há um enorme desafio em se fazer livros sobre empresas e empresários no Brasil. Na maioria das vezes, acabam caindo em duas categorias: tornam-se obras necessárias de jornalismo investigativo, alguns calcados em escândalos já públicos, e saem a contragosto da pessoa retratada; ou são publicações com o aval dos personagens. Estes surgem para inspirar pessoas e carregam as virtudes e imperfeições ao retratar, basicamente, a visão do próprio biografado.

“Luiza Helena – Mulher do Brasil”, de Pedro Bial, que retrata a trajetória de Luiza Helena Trajano, sobrinha da “tia Luiza”, a fundadora do Magazine Luiza, está claramente no segundo grupo – algo que o leitor já percebe de cara pela nota da publisher. “Precisamos ter um livro dessa mulher […] e permitir que sua visão se torne ferramenta para novas lideranças”, diz Rosely Boschini, diretora da Editora Gente, que publica o livro. Luiza mesma se envolveu na obra diretamente, após a princípio ter descartado a ideia.

Ela embarcou no projeto apresentado por Bial e inclusive indicou nomes de amigos, funcionários, consultores e fornecedores que os pesquisadores poderiam procurar para falar sobre ela. A ideia do autor surgiu após a entrevista da empresária ao programa “Conversa com Bial”, em setembro de 2020. Já havia uma discussão de um livro, dentro do Magalu, sobre a metodologia de trabalho de Luiza, que acabou evoluindo para a obra recém-lançada.

Há um valor inegável no livro curto, de 319 páginas (mas de letras grandes, um pedido de Luiza, e com punhado de fotos), em se aprofundar em questões pessoais, ao trazer aspectos pouco conhecidos fora do círculo próximo de Luiza. É algo que a aproxima do leitor comum por um terreno novo. Entram como exemplos a dolorosa separação do marido, Erasmo, após Luiza ter se apaixonado por outra pessoa (depois de dez anos juntos), e as complicações numa “quase morte” que enfrentou depois de uma cirurgia de redução de estômago, em 2009. Uma fissura no estômago levou a uma perda de quase 60% de seu sangue.

Há ainda aspectos da vida da tia Luiza, mulher que construiu o negócio do zero, em plenos anos 1950, de complexa personalidade, e cujos valores se formaram na família a partir dali. Tia Luiza dava responsabilidades, mas cobrava. Era implicante, muitas vezes, talvez pelo faro comercial. O livro conta, por exemplo, que funcionários compravam produtos vendidos na entrada da loja para ajudar a bater a meta dada por ela à chefia.

Outro capítulo mostra a história de um funcionário contando, entre risos, ao filho de um cliente de baixa renda, que uma bicicleta à venda custava R$ 1. A tia viu a cena, vendeu a bicicleta por R$ 1 e cobrou a diferença do empregado.

O autor ainda dá detalhes do convívio nos dias atuais de Luiza com a tia, de 95 anos, diagnosticada com demência, e a relação de Luiza com o pai, Clarismundo (e as frustrações que ele carregou em vida), e a mãe Jacira (com crises sérias de saúde), assuntos de que a empresária raramente fala.

A obra repete em diversos momentos a admiração por Luiza de todos os entrevistados, como é de se esperar, mas há declarações mais fortes, como as do filho Frederico Trajano. Fred enaltece o legado da mãe, mas diz que não é “marionete” e é “dono de sua carreira e suas escolhas”. No campo político, o livro diz que Luiza é mais “progressista que que conservadora” – ou “capitalista de esquerda”, como diz o empresário Flávio Rocha, com quem Luiza tem diferenças ideológicas. “Luiza ainda acredita no papel provedor do Estado”, diz Rocha.

Fatos já amplamente explorados em revistas e jornais, como a perda da compra do Ponto Frio, em 2009, para Abilio Diniz, somam pouco ao que já se sabe no mercado. Já a sucessão na rede, para a entrada de Frederico, em 2016, acerta ao mostrar, de forma mais contextualizada, a visão de Fabrício Garcia, sobrinho de Luiza, sobre o processo. Fabrício também era um candidato natural à presidência, e uma briga seria péssima para a família e a companhia.

Não espere o leitor, porém, que a publicação avance em apurações “off the record” junto a fontes de mercado, ex-executivos ou ex-sócios, que provavelmente renderiam uma outra percepção de velhas histórias. O livro, inclusive, não tem bibliografia ou muitas referências a reportagens da imprensa. A explicação é que buscou contar a história de Luiza por Luiza. E que não se trata de um livro sobre o grupo – o que de fato não é. O Magalu está lá presente, naturalmente, mas houve um esforço do autor em separar temas.

Talvez por evitar temas do grupo, não há menções na obra ao envolvimento atual de Luiza na empresa, que passa por período duro, e teria levado a uma aproximação maior dela ao dia a dia do negócio, apoiando o filho. O Magalu enfrenta uma forte queda em seus papéis na bolsa há meses, afetado pela retração da demanda por bens duráveis desde setembro do ano passado. Vem tentando vender mais pelo seu “marketplace”, que reúne produtos de vários lojistas.

Luiza foi chamada pelo filho para liderar uma caravana pelo país para buscar lojistas para essa plataforma, hoje vital para os negócios. Ela topou – talvez assunto para outro livro.

Luiza Helena – Mulher do Brasil

Pedro Bial, Editora Gente, 319 págs., R$ 59,90