Já é hora de o Copom parar de subir a taxa Selic?

Setores alertam que continuidade do aperto monetário pode enfraquecer ainda mais a economia

O mercado espera para esta quarta-feira (2) um novo aumento da taxa Selic. A principal aposta é que o Copom (Comitê de Política Monetária do Banco Central) eleve os juros básicos da economia em 1,5 ponto percentual, de 9,25% para 10,75% ao ano – maior patamar desde maio de 2017. As atenções também estarão concentradas no comunicado do colegiado ao anunciar a decisão, que deve trazer respostas mais claras sobre a continuidade e o ritmo do aperto monetário.

Até aqui, a principal preocupação do BC tem sido trazer a inflação para a meta, o que pode ser alcançando apenas 2023. O último boletim Focus mostrou uma piora do cenário, com os especialistas das instituições financeiras subindo as projeções para o IPCA (Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo) em 2022, de 5,15% para 5,38%, e no ano que vem, de 3,40% para 3,50%.

A despeito de ser amplamente esperado, o aumento é criticado por diversos setores da economia.

Muitos especialistas apontam que a principal causa para o aumento da inflação no Brasil (e no mundo) nos últimos meses é a ruptura das cadeias de fornecimento devido à pandemia de Covid-19, que tornou as matérias-primas mais caras. Então, uma elevação dos juros não teria muito efeito em diminuir a inflação neste momento.

Além disso, o mercado teme os possíveis reflexos negativos na economia. “Alguns fatores pesam na decisão da autoridade monetária. Pelo lado dos preços, ainda há desafios no combate à inflação. Reajustes dos combustíveis, dos alimentos e das passagens de transporte público são fatores que acentuam a escalada de preços”, observa o economista Gustavo Sung, da casa de análises Suno Research. “Entretanto, o BC tende a evitar um ‘overkill’, ou seja, um aperto monetário exagerado, e comprometer o PIB de 2023. O receio é jogar a Selic a um patamar que reduza, em muito, a atividade econômica”, acrescenta.

O temor de que a subida dos juros paralise ainda mais a economia é compartilhado principalmente pelo setor produtivo. “No último aumento da taxa, nós ponderamos que seria importante o BC parar com sua escalada, porque a economia não está forte. Está andando de lado, com alguns poucos segmentos em situação ligeiramente melhor”, aponta Fernando Valente Pimentel, presidente da Abit (Associação Brasileira da Indústria Têxtil e de Confecção). O dirigente reforça que o Copom deveria encerrar o ciclo de alta da Selic. “Os juros altos inibem o investimento e o consumo, com as pessoas com muita dificuldade para honrar seus compromissos. É uma estratégia nociva para a retomada do crescimento e a geração de emprego e renda”, avalia.

O dado perceptível é que aperto monetário, entre outros motivos do cenário econômico, tem colaborado para frustrar a confiança dos empresários, especialmente as expectativas sobre os rumos dos negócios. O ICE (Índice de Confiança Empresarial) do FGV IBRE (Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas) caiu 2,5 pontos em janeiro, para 91,6 pontos, menor nível desde abril de 2021, quando a Selic estava em 2,75% ao ano.

Entre os setores, a construção foi um dos destaques negativos, com a confiança baixando 3,9 pontos no mês, para 92,8 pontos, menor nível desde junho de 2021 (92,4 pontos). “O indicador revela um pessimismo mais acentuado em relação à demanda prevista para os próximos meses. Certamente o ambiente de mais incertezas com a evolução da pandemia e de taxas de juros maiores deve ter contribuído para a reversão do humor”, comenta Ana Maria Castelo, coordenadora de projetos da construção do FGV IBRE. “A retomada da construção ganhou fôlego em 2021 com o desempenho positivo do mercado imobiliário. Vendas e lançamentos cresceram impulsionados por taxas de crédito, que em agosto atingiram um piso histórico. A mudança de cenário terá impactos sobre os novos negócios em 2022”, completa.