EUA e europeus tentam colocar um teto sobre os preços do petróleo

Medida seria uma forma de retaliar a Rússia e ao mesmo tempo proteger a economia global de uma possível recessão

Os EUA e seus aliados estão tentando encontrar maneiras de conter novas altas dos preços globais do petróleo, na tentativa de equilibrar os esforços para reduzir as receitas obtidas pela Rússia com a venda de energia, protegendo ao mesmo tempo a economia mundial de uma possível recessão.

A secretária do Tesouro, Janet Yellen, disse na última semana que os EUA estão envolvidos em discussões “muito ativas” com aliados europeus sobre os esforços para formar um cartel de compradores que estabeleça um teto ao preço do petróleo russo. Um dos objetivos da discussão é manter o petróleo da Rússia disponível nos mercados globais para compradores como Índia e China, o que poderia ajudar a estabilizar os preços que já se aproximam do dobro do nível registrado antes da pandemia. Ao mesmo tempo, a iniciativa criaria um mecanismo que os países ocidentais poderiam usar para restringir as receitas russas com as vendas de seu petróleo.

“Acho que o que queremos fazer é manter o petróleo russo fluindo para o mercado para segurar os preços mundiais e tentar evitar uma alta que provoque uma recessão mundial e aumente os preços do petróleo”, disse Yellen. “Mas sem dúvida o objetivo é limitar a receita que vai para a Rússia.”

A União Europeia (UE) e os EUA já agem para proibir as importações de petróleo russo após a invasão da Ucrânia, e a UE também está avançando na proibição dos seguros de embarques de petróleo russo. Como as entidades europeias importam uma quantidade muito maior de petróleo russo e embarcam e fazem seguros de grande parte dele globalmente, suas movimentações têm consequências maiores para os preços mundiais.

Yellen disse que as medidas da UE poderão aumentar significativamente os preços mundiais do petróleo, ressaltando a dificuldade que os formuladores de políticas têm em tentar punir a Rússia e ao mesmo tempo limitar os danos à economia mundial.

Uma ideia que está sendo discutida pelo G-7 (grupo das sete maiores economias ricas) é recorrer às seguradoras para tentar estabelecer um teto de preço. Os embarques de petróleo são sempre segurados por empresas da UE ou Reino Unido, e as autoridades estão explorando a possibilidade dessas seguradoras cobrirem só os embarques de petróleo russo para países não europeus que se enquadrarem no preço máximo, segundo fontes a par das discussões. Tal medida, acrescentaram, seria elaborada para ser consistente com a proibição dos seguros da UE.

Autoridades do Departamento do Tesouro dos EUA estão em viagem ao Reino Unido e a Europa continental para discutir sanções, e o vice-secretário do Tesouro, Wally Adeyemo, juntou-se ao grupo que rumou para Londres no começo da semana.

Com os preços da gasolina atingindo patamares recorde nos EUA e a inflação sendo a principal prioridade econômica do governo Joe Biden, as autoridades americanas estão analisando meios para tentar estabilizar os preços mundiais do petróleo e ainda assim penalizar a Rússia, segundo disse um autoridade do Tesouro americano.

Autoridades europeias afirmam que as discussões continuam no G-7, sobre como trabalhar com os EUA e outros países para assegurar que as sanções energéticas terão um efeito global sem provocar um aumento nos preços do petróleo e do gás natural, embora não haja indicações de que a UE vá reavaliar as sanções ao petróleo e aos seguros que aprovou após semanas de negociações difíceis.

Alguns analistas acreditam que as medidas da UE prejudicarão permanentemente a capacidade da Rússia de produzir e vender petróleo, impondo uma pressão significativa sobre os preços globais do petróleo no longo prazo. Os russos enfrentam grandes obstáculos logísticos para vender grandes volumes de petróleo em outras partes do mundo e, segundo analistas, são forçados a fechar poços quando ficam sem espaço para armazenamento.

A Rússia, que segundo analistas já está vendendo petróleo com um desconto de cerca de US$ 30 por barril em comparação aos preços referenciais globais, recebe cerca de US$ 10 bilhões por mês da UE pela venda de petróleo e derivados, segundo o centro de estudos Bruegel de Bruxelas. A Rússia exportava cerca de 2,5 milhões de barris de petróleo por dia para a UE antes da guerra.

“Achamos que é um tanto limitada a quantidade de petróleo que a Rússia consegue colocar em outros lugares”, disse Bob McNally, presidente da Rapidan Energy Group, que trabalhou na política de energia do governo George W. Bush. Ele disse que as exportações russas poderão cair até 3 milhões de barris/dia. “Isso é uma perda na produção mundial de petróleo”, afirmou McNally.

Cortes de produção ainda maiores na Rússia podem elevar o preço global do petróleo para US$ 200 o barril, um salto que poderia jogar grande parte do mundo em uma recessão, diz Claudio Galimberti, vice-presidente sênior de análises da consultoria Rystad Energy. Na sexta-feira, o petróleo Brent — referência internacional — foi negociado acima de US$ 120 o barril.

“Uma redução rápida demais da produção russa pode ser extremamente prejudicial e assim precisamos ser muito cuidadosos com isso”, disse ele. “Há equilíbrios muito frágeis e no momento em que você mexe com isso o mercado precisa de um tempo para encontrar outro ponto de equilíbrio. Isso leva tempo e pode ser doloroso.”

Os saltos significativos nos preços globais do petróleo não só alimentam a inflação ao redor do mundo, como também permitem à Rússia manter ou até mesmo aumentar a receita líquida com as vendas de petróleo, mesmo perdendo compradores. Yellen já havia dito anteriormente que o embargo europeu ao petróleo russo poderia acabar permitindo à Rússia obter mais receita líquida com suas vendas de petróleo com o aumento dos preços globais.

Outros acreditam que a Rússia se adaptará às medidas da UE e conseguirá continuar vendendo uma quantidade parecida de petróleo em mercados não europeus, o que significa que o embargo da UE acabaria fazendo pouco para reduzir os fluxos de dinheiro para a Rússia. A Índia em particular aumentou suas compras de petróleo russo desde o início da guerra.

Um teto estabelecido no preço do petróleo russo por meio de seguradoras da UE e Reino Unido limitaria a receita que a Rússia pode obter com essas outras vendas. Outra opção para estabelecer um teto nos preços seria o uso de sanções secundárias, um passo que Yellen disse que está sendo discutido.

Um possível regime de sanções secundárias ameaçaria os países — em especial a Índia e a China — com a perda de acesso a instituições financeiras americanas se eles comprarem petróleo russo a um preço fora dos parâmetros estabelecidos pelos EUA. Mas tal medida implica em riscos diplomáticos para os EUA, tanto em relação à Índia e China, como também à UE, que anteriormente resistiu a sanções secundárias dos EUA.

Embora estabelecer o teto por meio de sanções aos seguros possa ser menos difícil para os EUA diplomaticamente, o objetivo é parecido: encontrar uma maneira de o petróleo russo continuar sendo vendido. “Talvez você queira que algum petróleo vá para a China e a Índia para evitar que os mercados fiquem completamente malucos”, diz Galimber da Rystad Energy.