Análise: Guedes chama atenção da classe política ao buscar entendimento entre Bolsonaro e STF

Ministro vira "bombeiro" na crise com o Judiciário, mas é confrontado com desconfiança sobre moderação do presidente, diz Fábio Zambeli, do JOTA

O engajamento do ministro da Economia Paulo Guedes na ofensiva deflagrada por auxiliares do presidente Jair Bolsonaro (PL) na tentativa de reconstruir pontes com a cúpula do Judiciário chamou a atenção da classe política.

O chefe da equipe econômica do governo se expôs mais do que o habitual em tratativas abertas na última semana com atores do STF e de outros órgãos de controle em busca de um protocolo para baixar a tensão entre os Poderes.

Os argumentos de Guedes visam não só restabelecer um convívio minimamente civilizado entre o chefe do Executivo e os ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) até o 7 de Setembro, como também evitar o que chamou de “clima de revanchismo” contra Bolsonaro, caso ele seja derrotado nas urnas.

O ministro sempre manteve um canal de diálogo ativo com os magistrados para tratar de temas que envolvem as contas públicas e a segurança jurídica das medidas da seara econômica. Contudo, o papel político e institucional de Guedes é uma novidade para muitos integrantes da Corte e pessoas próximas dos ministros.

Os interlocutores de Guedes não acreditam que ele consiga demover o presidente do discurso beligerante contra os integrantes da Suprema Corte, mas entendem que a tentativa é “louvável”.

Esses mesmos operadores afirmam que não há expectativa de “moderação” de Bolsonaro, apesar das gestões feitas por membros do seu QG de campanha.

Para esse grupo, a preocupação de Guedes com a relação entre os Poderes aumentou de forma substantiva com a resposta institucional de pesos-pesados do PIB nacional, cristalizada nos documentos em favor da democracia e em defesa das urnas eletrônicas.

A adesão de entidades como a Fiesp e a Febraban acendeu o alerta amarelo também na área econômica do governo, já que Guedes esperava que organismos que simbolizam setores relevantes da economia fortemente regulados tivessem, ao menos, receio de encampar a onda de manifestos e cartas em favor do TSE.

“Apesar das divergências, ninguém no governo esperava que houvesse essa adesão. Agora, mesmo que se discorde, o melhor é procurar um entendimento. A economia vem se recuperando bem, produzindo boas notícias. Não interessa a ninguém esse ambiente. O país está no caminho correto e o eleitor vai decidir com tranquilidade”, afirma ao JOTA uma fonte credenciada do Planalto.

“Pacificação”

Os pleitos levados ao STF como forma de atenuar os ataques de Bolsonaro ao sistema eleitoral estão longe de serem atendidos ou sequer avaliados pelos magistrados. Emissários do presidente insistem em propor que Alexandre de Moraes, que vai presidir o TSE a partir do dia 16, se afaste das investigações conduzidas em dois inquéritos que atingiriam o círculo íntimo bolsonarista — o das Fake News e o dos atos antidemocráticos. A tese, entretanto, é refutada na Corte.

Já que acordos estão fora do radar, pelo menos por ora, sobraria ao STF a opção de adotar uma conduta “mais construtiva” no embate com o Executivo.

Em parte, um dos mais ativos interlocutores de Guedes no Supremo, o ministro Luiz Fux, endereçou o assunto na fala em que abriu os trabalhos do Judiciário após o término do recesso. No discurso, presidente da Corte disse esperar “que as eleições transcorram sem incidentes, com paz”. “Adversários não são seus inimigos”, afirmou o ministro.

Em recado direto a Bolsonaro, Fux também defendeu o sistema eleitoral, que chamou de “um dos mais eficientes, confiáveis e modernos do mundo”.

(Por Fábio Zambeli, analista-chefe do JOTA em São Paulo)