OPA: o que significa para o bolso dos investidores quando uma empresa sai da bolsa?
CVM mostra que cinco empresas protocolaram pedidos de OPA em 2023, recorde desde 2016
No primeiro trimestre de 2023, o número de empresas que fecharam capital na bolsa de valores, a B3, bateu recorde. Para você ter uma ideia, somente nos primeiros três meses do ano, cinco companhias registraram seus pedidos de OPA (Oferta Pública de Aquisição de Ações), o maior patamar para o período desde 2016.
Neste período, o Ibovespa, principal índice da bolsa, regrediu 7,16%. Ou seja, queda maior do que no período de 12 meses, de 4,85%. A seca na rentabilidade da bolsa fechou a torneira de receita a partir dos papéis listados.
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Como isso afeta o investidor?
Para o investidor, isso significa um mercado com menor número de empresas para investir. Portanto, mais concentrado. E isso pode até trazer perdas de oportunidade no ganho de capital.
Só para você ter uma ideia, a bolsa de Nova York (NYSE), a principal bolsa do mundo, tem 2.500 empresas listadas com valor de mercado em torno de US$ 40 trilhões. Já o Ibovespa, que acabou de anunciar sua mais recente composição, concentra 83 empresas, com as 86 ações mais negociadas do pregão.
OPA bate recorde em meio a juros altos
De acordo com dados da CVM (Comissão de Valores Mobiliários), o primeiro tri deste ano foi o maior em registro de OPAs desde 2016. A autarquia do mercado de capitais analisa, no momento, sete pedidos de aquisição de ações, sendo três de alienação de controle e quatro de cancelamento de registro na Bovespa.
O destaque de OPA para este ano, por enquanto, é da EDP Brasil (ENBR3), subsidiária da EDP de Portugal, que planeja deixar a bolsa de valores.
No caso da distribuidora, o processo será de aquisição das ações pelo preço de R$ 23,73, valor anunciado pela própria empresa — antes o preço de cada papel na operação era de R$ 24. Os papéis da empresa estão entre os “queridinhos” dos investidores pela distribuição de dividendos.
Além da EDP, quatro empresas de capital aberto entraram com pedidos de fechamento neste ano. A partir dos dados da CVM, a Inteligência Financeira calculou que este é um ano para OPAs semelhante a 2016, quando o Brasil enfrentava recessão econômica — também foram feitos, na época, cinco pedidos de OPA no 1º tri.
Mas esse nível foi atingido recentemente, na base trimestral: o 3º tri de 2022 também teve cinco OPAs protocoladas.
Por que as empresas querem fechar capital?
A estratégia para aquisição pública de ações das companhias pode variar. No caso de companhias de menor porte, a expansão de controle dos sócios de referência é uma estratégia que pode ser atingida via fechamento de capital. Na maioria desses casos, esses investidores já têm em mãos a maioria das ações emitidas.
Aliás, para empresas maiores, como a EDP Brasil, a estratégia pode ser uma questão de desvalorização na bolsa. São exemplos de empresas que veem prejuízo na comparação entre o preço das ações logo após o IPO ante o atual valor de mercado. Muitas consideram o resultado ruim e preferem derrubar o ticker.
Procurada pela reportagem sobre seu processo de fechamento de capital, a EDP nos informou o seguinte: “A EDP informa que toda a comunicação referente à Oferta Pública será realizada pelo Ofertante por intermédio de Comunicados ou Fatos Relevantes à medida que o processo avançar”.
Abaixo, listamos cinco pontos que levantamos com analistas de mercado e que mostram os motivos que levam as empresas a tirar seus papéis do mercado:
1. Taxas de juros e dívidas levam à OPA
Afinal, manter o capital aberto “é uma operação bastante custosa”, diz Pedro Paulo Silveira, diretor de gestão de ativos da Nova Futura Investimentos. O aumento de pedido de OPAs, nesse caso, reflete o estado do mercado de capitais, segundo ele.
“As empresas estão muito desvalorizadas na bolsa. Como tem empresas muito descontadas em relação ao fair value delas, vale a pena fechar o capital. Elas estão de olho na arbitragem de dívida e custo da operação”, diz.
A alavancagem, com a taxa de juros a 13,75% ao ano até agora, cresceu e fez com que as empresas repensassem as oportunidades no mercado de capitais. Seja por uma operação de follow-on ou OPA, o que entra em jogo é a estratégia da empresa no longo prazo.
2. Baixa natural
Por outro lado, quadriênio entre 2018 e 2021 foi um período de bonança das S.A no mercado, aponta Marco Dorigon, sócio da assessoria Unio Partners. Trata-se, na visão dele, de um ciclo natural da economia.
“Vivemos recentemente um período com taxa de juros muito baixa no Brasil, comparada com as médias que o país sempre teve. Isso produziu uma série de de movimentos na bolsa, e talvez o mais importante seja o de pessoas físicas que passaram a investir mais direta ou indiretamente em ações”, afirma.
Com uma Selic de 2% ao ano em 2020, o ambiente era favorável para que mais empresas aplicassem o que Dorigon chama de “teses de crescimento”.
3. Valuations que fogem da realidade
Durante a pandemia, os valuations das empresas subiram significativamente. O valor das companhias na bolsa de valores se beneficiou da injeção de capital via programas de estímulo a crédito e de renda básica, o que levou muitas empresas a realizarem IPO em um momento de “oportunidade”, diz Dorigon.
“E isso fez com que muita gente acabasse listando as suas companhias a valuations que não obrigatoriamente condiziam com a realidade daquelas companhias. Análises mais fundamentalistas não levariam aos mesmos valores porque, no fundo, a composição de valuation na bolsa é um híbrido que uma análise mais fundamentalista e a lei de oferta e demanda”, diz.
4. Comprar para vender depois
Junto ao aumento dos juros, a instabilidade política das eleições de 2022 e após a posse de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) fez com que o valor das listadas caísse.
“Se o papel na bolsa não está indo bem, daí vale a pena comprar talvez para vender depois. O Ibovespa dá um sinal para o manager que não é a empresa dele que está mal. Mas o gatilho para a decisão é o valor de mercado da empresa. Se o cenário não é promissor, não valeria a pena comprar.”
Pedro Paulo Silveira, diretor de Gestão da Nova Futura Investimentos
5. Bolsa barata para o estrangeiro
Ao mesmo tempo, o cenário conta com fundos de private equity, de capital privado, altamente capitalizados para compra de empresas brasileiras.
Afinal, a B3 está mais barata para o investidor estrangeiro que pretende alocar em alguma S.A — e isso pode justificar uma OPA.
“Vivemos um momento em que tanto investidor de referência quanto os estrangeiros enxergam boas oportunidades porque as empresas estão mais descontadas. Essas companhias vão capitalizar para testes de crescimento”, diz Dorigon ao também afirmar que o movimento pode desencadear mais fusões e aquisições, ou M&As.
O que aconteceu com a Hapvida (HAPV3)?
Recentemente, uma tendência vêm permeando o mercado de capitais brasileiro em um cenário de seca: follow-ons e aumentos de receita capitaneados pelos acionistas de referência da empresa.
É o caso de Hapvida (HAPV3) que, após uma queda exponencial das ações, teve uma oferta subsequente de ações e contratos de sale e leaseback de imóveis. O movimento foi liderado pela controladora de referência da empresa, a família Pinheiro.
Dasa (DASA3) e 3R Petroleum (RRRP3) anunciaram aumento de capital através da emissão de novas ações. Acionistas que tiverem preferência na subscrição dos papéis mas se recusarem a participar do processo podem ter sua participação diluída.
Próximo passo: aumento das fusões e aquisições
No primeiro sinal de sufoco, em meio a atual taxa de juros, os acionistas de referência têm papel essencial para assegurar o investidor de teses de investimento, diz Fatima Hasson, Sócia de M&A do DC Associados.
“O controlador vai querer preservar valor da companhia, vai subsidiar a oferta, especialmente se esse controlador está conseguindo capital mais barato”, comenta.
A concentração de OPAs obriga empresas a deixarem a inércia da bolsa para expandirem o capital, avaliam especialistas. Uma possível consequência é o aumento de fusões e aquisições (M&As).
“Analisamos aqui na Unio que movimentos como esse acontecerão de uma forma um pouco mais recorrente”, como a exemplo da empresa química Elekeiroz, diz Dorigon.
Com as sementes de OPAs e M&As plantadas para o investidor, eventualmente as mesas empresas que fecham capital podem voltar a bolsa para colher frutos de um novo IPO.
“A OPA pode acontecer para chamar atenção para um novo M&A. Em companhias abertas [o M&A] é muito mais complexo. Em um momento de crise, quem está mais capitalizado consegue se sobressair em movimentos de aquisição, porque a parte mais fragilizada está desesperada em um momento de liquidez”, diz Fatima.
“É traumático fechar capital, convencer acionistas e projetar o bem-estar da empresa.”
Fatima Hasson, Sócia de M&A do DC Associados
Quais companhias querem fechar capital?
Uma fonte disse à Inteligência Financeira que tem recebido cada vez mais sondagens para fechamento de capital, e elencou dois setores como sendo mais frágeis: varejo e indústria.
Dentro do setor industrial, o economista explica que companhia mais antigas listadas na bolsa tendem a olhar oportunidades a partir de OPA. Há muitas oportunidades novas para o setor, mas as S.A industriais tem visto “pouca atividade” nas palavras da fonte.
Contudo, a mesma falta de atividade pode ter vida curta no varejo. Apesar do estado crítico do setor, a expectativa é de que as famílias brasileiras retomem o consumo pelos próximos anos.
“E isso vai fazer com que o setor de consumir varejo cresça, haja consolidações dentro dos vários nichos desse setor e mais oportunidades para investimentos privados desses agentes consolidadores”, diz o economista atende empresas à procura de OPA.
Fechamento de capitais é ruim para o investidor?
O efeito das OPAs no mercado de capitais é bastante negativo, dizem especialistas consultados pela IF. Isso porque fechar capital na bolsa concentra o mercado e perda de oportunidade. Para quem estava alocado em uma empresa que passa por esse processo, o prejuízo é ainda maior.
A possibilidade do investidor recuperar o dinheiro em ações, como por exemplo as da EDP, é nula, afirma Pedro Paulo, da Nova Futura. Mas o preço da ação a ser adquirida pela companhia depende das condições de mercado.
De acordo com a Lei das S.A, o preço das ações negociadas pela empresa não pode ser menor que o valor de avaliação da companhia no exercício financeiro. A tendência é que as empresas tentem forçar o preço para baixo, diz o economista.
Quais são as consequências para os investidores?
Para Mirella da Costa Andreola, da Machado Associados, o investidor pode enfrentar mais dificuldades de acompanhar o mercado em meio a fechamentos de capital. A bolsa, contudo, deve adquirir “mais musculatura”, o que significa bons retornos em empresas mais maduras e com tese de investimentos mais seguras.
“A OPA mostra um mercado difícil. O Brasil já tem poucas empresas negociadas na bolsa em relação a emergentes, e isso reduz a possibilidade de diversificação em capital”, prossegue Pedro Paulo.
A diversificação é a receita de bolo favorita dos investidores para se protegerem de perdas com o risco.
Com a OPA, a S.A rompe um ciclo de abertura na B3. A corda arrebenta para o lado mais frágil da negociação: o investidor pessoa física.
Ele pode continuar acompanhando a empresa de longe, sem informações por meio de balanços, para tentar capitalizar em um novo IPO. Mas isso pode durar anos, afirmam os especialistas do mercado financeiro.