Tom no setor de imóveis é ser seletivo no atual cenário
Expansão lançamentos e vendas desacelerou a partir do quarto trimestre; para 2022, incorporadoras estão cautelosas com as incertezas
O cenário de incerteza – com inflação e juros em alta, e um ano dominado por eleições majoritárias no país – levou incorporadoras a adotarem postura mais cautelosa ao traçar seus planos para 2022. Os famosos “guidances”, ou seja, as metas para o ano, cedem lugar ao discurso de boa parte das empresas de que as decisões serão tomadas a partir do monitoramento mais cuidadoso do mercado. “O tom é de seletividade. No ano, os lançamentos serão avaliados caso a caso”, diz Bruno Mendonça, analista de mercado imobiliário do Bradesco BBI.
Em conjunto, Cury, Cyrela, Direcional Engenharia, Even, EZTec, Lavvi, Melnick, Mitre, Moura Dubeux, MRV&Co, Plano&Plano, RNI e Tenda lançaram Valor Geral de Vendas (VGV) de R$ 35,1 bilhões, em 2021, com crescimento de 40,5%. De outubro a dezembro, houve expansão, mas em patamar menor, de 18,6%, para R$ 11,7 bilhões. “Aparentemente, a maioria teve coragem de colocar projetos na rua. Os lançamentos do trimestre sinalizaram confiança de que o setor está se acomodando, mas não, congelado”, avalia Mendonça.
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As vendas líquidas tiveram, no ano passado, aumento de 22,4%, para R$ 28,1 bilhões. No trimestre, o total comercializado pelas incorporadoras cresceu 5,4%, na comparação anual, para R$ 7,8 bilhões. Assim como ocorreu no terceiro trimestre, as vendas foram, parcialmente, afetadas por uma fatia dos lançamentos ter se concentrado no fim do período. Mas houve também desaceleração do ritmo de compra de imóveis devido a preços mais elevados em decorrência do aumento de custos.
Incorporadoras com prioridade de atuação nas rendas média e alta são as mais impactadas pelo ambiente macroeconômico. Assim como o aumento de preços de imóveis dificulta a capacidade de compra, a elevação de juros do crédito imobiliário torna mais difícil, principalmente para a classe média, o enquadramento das parcelas à renda do cliente, destaca Ygor Altero, analista-chefe do setor de construção civil da XP.
O aumento dos casos de covid-19 e de influenza contribui para a postura mais cautelosa das incorporadoras. “Temos R$ 2 bilhões em projetos aprovados. Há espaço para lançar no mesmo ritmo de 2021, mas a companhia ainda vai tomar a decisão em relação a isso. O ‘guidance’ será anunciado no momento correto”, disse, recentemente, o diretor financeiro e de relações com investidores da EZTec, Emilio Fugazza. A incorporadora não cumpriu sua meta de lançamentos para o biênio 2020-2021, alcançando 76,5% do piso da faixa.
No segmento de baixa renda, incorporadoras tem dado prioridade à atuação na faixa 3 do Casa Verde e Amarela e no segmento logo acima do teto do programa habitacional. Houve ajustes no limite de preços desse grupo e redução dos juros. O setor aguarda anúncio pelo governo de medidas que favoreçam também o grupo 2. Altero, da XP, diz preferir a atuação das incorporadoras de baixa renda justamente na faixa 3 e ligeiramente acima, segmentos em que é possível “preservar rentabilidade”.
A Cury não vai atuar nos grupos 1 e 2 “até que ocorram ajustes”, segundo o diretor de crédito imobiliário, relações institucionais e com investidores, Ronaldo Cury. “Se o governo revisar o teto da faixa 2, temos produtos na prateleira para lançar”, disse, nesta semana, o copresidente da MRV&Co Rafael Menin.
O grupo MRV, a Cury e a Plano&Plano apresentaram recordes em 2021. Na MRV&Co, o desempenho das demais subsidiárias superou o da incorporadora brasileira, mas esta também cresceu em lançamentos.
A Direcional encerrou 2021 com VGV lançado total – recorde – de R$ 3,14 bilhões, o que representa aumento de 78%. A marca Direcional, com unidades enquadradas das faixas 2 e 3 do Casa Verde e Amarela, elevou lançamentos em 24%, para R$ 1,85 bilhão. Na Riva, destinada à média renda, houve expansão de quase 4,7 vezes, para R$ 1,29 bilhão.
“A Direcional [companhia] lançou R$ 1,1 bilhão em 2017. Criada há dois anos, a Riva teve VGV maior do que o da Direcional há quatro anos”, compara o presidente, Ricardo Ribeiro. Segundo ele, a demanda elevada por imóveis da subsidiária de média renda resulta de produtos bem localizados, com área de lazer completa, vendidos a preços competitivos como consequência da “eficiência na execução de obras”.
No ano, as vendas líquidas da Direcional cresceram 45%, para R$ 2,44 bilhões – R$ 1,65 bilhão da marca que leva o nome da incorporadora, R$ 776 milhões da Riva e R$ 19 milhões de unidades do legado de safras antigas. No trimestre, os lançamentos consolidados, no valor de R$ 693 milhões, ficaram em linha com os do mesmo período de 2020. De outubro a dezembro, as vendas consolidadas tiveram expansão de 27,7%, na comparação anual, e de 3,9% ante o terceiro trimestre, para R$ 668 milhões.
“Tivemos um bom ano, com crescimento nos nossos dois segmentos de atuação. Entramos em 2022 cautelosos com juros e inflação mais altos e atentos a como vai ser a geração de empregos. Estamos muito bem preparados, com produtos disponíveis para venda e projetos em aprovação para ofertar imóveis para atender às demandas de Direcional e Riva”, afirma Ribeiro.
No entendimento do analista da XP, a produção imobiliária para a baixa renda tende a se beneficiar do fato de 2022 ser um ano de eleições majoritárias, considerando-se a expectativa de que o programa habitacional será mantido independentemente de quem seja o vencedor do pleito.
Nos últimos 12 meses, as ações das incorporadoras foram fortemente impactadas pelo aumento dos juros, que afeta tanto a demanda quanto o grau de endividamento de empresas.
As dez ações mais líquidas de incorporadoras listadas na B3 tiveram desvalorização – Cyrela (45,48%), EZTec (51,65%), MRV (41,38%), Viver (1,58%), Tenda (50,03%), Gafisa (58,64%), Direcional (16,35%), Even (41,19%), Helbor (62,33%) e Trisul (50,23%). “As quedas estão relacionadas a resgates por parte dos fundos, mas a falta de visibilidade do setor não ajuda”, diz Bruno, do Bradesco BBI.