‘Teremos petróleo elevado dois ou três anos’ , afirma CEO da 3R Petroleum

Executivo vê cotação do barril alta por mais tempo, o que favorece produção, mas diz que a saída não é ‘mudar arcabouços legais por razões transitórias’

Ricardo Savini, CEO da 3R Petroleum Leo Pinheiro/Valor/3-5-2022
Ricardo Savini, CEO da 3R Petroleum Leo Pinheiro/Valor/3-5-2022

Criada em 2014, a 3R Petroleum começou a sair do papel em 2016, quando a Petrobras iniciou a venda de campos maduros. Capitalizada na Bolsa em 2020, a empresa já comprou seis ativos de produção de petróleo e gás em terra e três no mar que já foram da estatal. Opera quatro e aguarda até o início de 2023 o fim do processo de transição dos outros na Agência Nacional de Petróleo (ANP) para intensificar os investimentos na revitalização da produção de 60 campos, diz o CEO da empresa, Ricardo Savini.

Geólogo com passagem pela Petrobras e outras companhias do setor, ele conta que a 3R vira a chave das aquisições para a produção num momento propício de alta do petróleo. Para ele, a cotação ficará em patamares elevados nos próximos anos, num sinal de que acelerar a transição energética não é simples.

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A 3R vem de uma fase de aquisição de ativos. Quais os planos da empresa agora?

Estamos em um ano de consolidação da companhia nessa nova indústria de revitalizar campos maduros, em fase de declínio, que não tínhamos no Brasil. Quando a Petrobras decide vender é que se inicia. Construímos a 3R para esse tipo de oportunidade. Somos a empresa que mais assinou contratos (de compra) com a Petrobras. Foi muito trabalho nessa primeira fase, onde o segredo é precificar corretamente, mas estamos em outro momento.

Em maio de 2020 assumimos nossa primeira operação, o polo Macau, no Rio Grande do Norte. Deixamos der ser pré-operacional. De nove ativos, quatro já estão sob gestão da 3R, onde conseguimos demonstrar incremento importante de produção, e estamos na transição operacional dos outros cinco.

Quanto tempo leva a transição e por que demora tanto?

Era para levar de oito a 12 meses. O primeiro ativo levou nove, mas os atuais estão levando 12. Em outros países, é feito em dois ou três meses. É o período que a ANP tem para analisar a transferência das concessões. Um contrato muitas vezes tem dezenas de campos. Outras empresas também estão comprando campos da Petrobras. Há um acúmulo de processos. Temos alguns atrasos por causa do Ibama (no licenciamento ambiental), em ativos offshore (produção no mar).

Enquanto isso, a Petrobras opera, vende o petróleo e o benefício econômico é nosso, deduzido do fee (pagamento mensal) estabelecido em contrato. Isso será abatido no dia do closing da operação, quando a ANP aprova e fazemos o pagamento final. Quem “sofre” são os municípios, as áreas abrangidas pelas operações. Você não reforma sua casa depois de vendê-la. Os ativos estão sem investimentos e, quanto mais tempo demora, há um declínio de produção. É ruim para a União também (na arrecadação de tributos).

Como se aumenta a produção em um campo que uma grande petroleira como Petrobras não quer mais?

Tudo se resume a uma questão de foco. Desde que a Petrobras descobriu o pré-sal, mesmo campos importantes no pós-sal já não têm prioridade nos investimentos dela. Imagine um campo terrestre que teve pico de produção entre as décadas de 1960 e 1980. É uma questão de tamanho.

A Exxon e a Chevron (grandes petroleiras privadas americanas) também vendem campos maduros. É como uma rede de hipermercados, que não vai manter pequenos mercadinhos de bairros. A Petrobras tem coisas mais importantes para fazer, e nós não temos nada mais importante do que nos dedicarmos a esses campos.

E como revitalizar a produção?

Aplicamos estratégias muito simples. Normalmente perfuramos muito mais, reduzindo o espaçamento entre os poços, aumentando a malha de drenagem do reservatório. Outra estratégia é injetar água, gás ou vapor para produzir uma onda de fluidos em direção a poços produtores, aumentando a pressão. No subsolo, nunca conseguimos recuperar 100% do petróleo. Não é uma piscina que você coloca um canudinho e tira tudo. Aquilo está dentro de uma esponja rígida, há um limite técnico e econômico de extração.

O fator de recuperação médio no mundo é 35%. Empresas se especializam em incrementar numa janela de eficiência entre 40% e 60%. A média brasileira é 21%, muito baixa em relação à internacional e mais ainda em relação às das empresas especializadas em campos maduros, que é o que somos. No Rio Grande do Norte, é 18%. Então vemos condições de produzir a mesma quantidade produzida até hoje nesses campos. Vamos perfurar milhares de poços.

Que leitura fizeram da cotação do petróleo para comprar campos da Petrobras no início da pandemia, quando o preço do barril despencou?

Somos uma equipe de pessoas experientes no setor. Já vivemos vários ciclos do petróleo. Não sabíamos quando, mas sim que ia subir. Como hoje está muito alto e, em algum momento, vai cair.

E qual é sua projeção agora?

Para a avaliação de investimento, não temos um preço. É uma commodity mineral com oscilações que você não controla. Temos para planejamento uma curva flat em torno de US$ 65 a US$ 70 no futuro.

Há a perspectiva de o barril se manter acima dos US$ 100 por algum tempo. Isso levou a empresa a acelerar projetos?

Estamos seguindo os planos, que manteríamos mesmo com preço mais baixo. Temos capacidade de acelerar um pouco, mas nossos planos já são relativamente acelerados.

Ainda pode ampliar o portfólio?

Nosso foco agora é concluir as transições operacionais, o que deve acontecer até o primeiro trimestre de 2023, e fazer a mágica, como chamamos, que é revitalizar, aumentar produção. Estamos contratando sondas de perfuração, já temos cinco ativas. Não é mais o momento de comprar ativos, até porque o petróleo está caro agora.

Acreditamos que vamos ter um cenário de preços elevados ainda por dois ou três anos. Portanto, é o momento de produzir. Produzimos quase 11 mil barris (de óleo equivalente por dia) nos quatro ativos que operamos, mas, somando os outros cinco, estamos falando de 40 a 45 mil. Para 2025 ou 2026, esperamos entre 90 mil e 100 mil.

A 3R começou a investir com os recursos da abertura de capital na Bolsa e de outras duas emissões de ações. Hoje, precisa de outra estrutura de capital? Juros altos dificultam?

Entramos em 2022 com dívida praticamente zero, para estarmos preparados para o pagamento final do polo Potiguar, de US$ 1,385 bilhão. Estamos conversando com bancos. A taxa de juros está subindo no Brasil e em outros países, mas o que vendemos também.Não percebemos dificuldade de levantar dívida. Para os bancos, emprestar para empresa de petróleo faz sentido.

Antes da atual crise, falava-se muito em transição energética. A alta do petróleo com a guerra na Ucrânia revelou o mundo ainda muito dependente dele. Como vê o futuro do petróleo?

Transições energéticas o planeta já viveu outras, e todas levaram décadas, potencialmente mais de século. Há uma heterogeneidade grande de atores. Quando estourou a guerra na Ucrânia, eu estava em Houston (EUA) em um evento da indústria de petróleo todo desenhado para falar de transição energética. Claramente a mensagem era: precisamos fazer a transição, mas produzam mais aí porque a gente está precisando de petróleo.

Nós investimos no setor porque sempre tivemos isso muito claro: a transição leva muito tempo. Se eu fosse um dinamarquês, provavelmente aceitaria pagar mais por energia de fonte renovável, porque tenho problemas resolvidos. Se sou um africano, não posso pagar esse prêmio. No ESG (sigla em inglês para políticas ambientais, sociais e de governança nas empresas), as pessoas às vezes se esquecem da letra S, a parte social.

Ainda leva um tempo para equilibrar os pilares ambiental e social. Tem que fazer nos fundamentos econômicos da matriz energética. Sem isso, é possível através de subsídios, penalidades para energia menos renovável, mas só em um mundo em paz. Crises geopolíticas acontecem, não são controladas por voluntarismo. Há questões históricas profundas. A gente, da indústria do petróleo, já viu várias, e vão acontecer mais. Sempre achei que essa transição vai levar décadas, e todo mundo tem que ter calma, assim como quando o preço da gasolina está alto.

Não adianta pensar em coisas muito esdrúxulas para resolver algo que ninguém aqui tem controle. Tem que ter um pouco de paciência porque passa. Quando desinflarem os conflitos geopolíticos, o preço volta à sua racionalidade. Eu sou geólogo, trabalho na indústria de óleo e gás, mas isso não quer dizer que não queira também frear o aquecimento global. Aqui não tem negacionismo nenhum. Temos que reduzir gases de efeito estufa, mas temos que fazer direito, sem atalhos. Já demonstramos que eles podem não funcionar.

Como vê propostas no Congresso de elevar impostos sobre produção e exportação de petróleo para subsidiar combustíveis? Como afetaria uma empresa como a 3R?

Em momentos de altas acentuadas dos preços do petróleo, todos os governantes do mundo são pressionados a tomarem decisões para mitigar esses aumentos. Entretanto, esses fenômenos são cíclicos, e não deveríamos mudar arcabouços legais por razões transitórias. Obviamente, de forma geral, seria muito ruim para decisões de investimento no setor petrolífero brasileiro se porventura perdêssemos atratividade para outros países. A 3R acompanha a evolução destas propostas, mas mantemos nosso foco em nosso portfólio de investimentos totalmente no Brasil.

Por Alexandre Rodrigues e Bruno Rosa, O Globo, do Rio de Janeiro.
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