O que esperar da atuação de Cristiano Zanin, o indicado de Lula para o STF
Para entender Zanin no Supremo é melhor enxergá-lo pelos processos que marcam sua história na advocacia
Cristiano Zanin é, evidentemente, muito mais do que o advogado de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) na Lava Jato. Sua atuação no processo criminal indica que não estará alinhado a Luís Roberto Barroso, Edson Fachin, Cármen Lúcia ou Rosa Weber na pauta de criminalidade (por mais que tenha começado sua caminhada na carreira como estagiário do Ministério Público na 5ª Promotoria Criminal). Também sugere um certo alinhamento a Gilmar Mendes, por exemplo, na preocupação com o superencarceramento (e isso traz reflexos em julgamentos sobre porte de drogas para uso pessoal, para ficar em exemplo mais imediato).
Mas para entender Zanin no Supremo o melhor é procurar outro ponto de observação. Para uma análise mais eficiente nesta difícil tarefa de projetar sua atuação, é melhor enxergá-lo pelos processos que marcam sua história na advocacia. E esses casos indicam que o futuro ministro Cristiano Zanin, se aprovado pelo Senado, terá particular preocupação com previsibilidade e estabilidade do Direito e, especialmente, em temas relevantes para o setor produtivo.
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Litígios altamente complexos
O histórico de sua atuação remete a casos de litígios altamente complexos e que envolveram grandes empresas. A começar pela aplicação da Lei Geral de Telecomunicações, de 1997, quando Zanin advogou para a Embratel. Depois sua atuação em prol da Febraban nos processos relativos a planos econômicos. Vieram posteriormente as ações de improbidade e de responsabilidade contra integrantes dos Banco Marka e FonteCindam.
O caminho do contencioso estratégico se tornou a especialidade de Zanin. E ele passou a exercer essa especialização em escritório próprio, depois de ter dado os primeiros passos no escritório de José Manoel Arruda Alvim, que se tornou uma referência para ele.
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Cristiano Zanin advogou com sucesso no caso Transbrasil, quando se discutia a falência da empresa; trabalhou na recuperação judicial da Varig, em 2005, num dos primeiros casos relevantes deste tipo no Brasil; também advogou na recuperação judicial da Oi; na disputa pela sucessão no caso da cervejaria Kirin-Schincariol; e, mais recentemente, estava trabalhando na defesa das Americanas.
Zanin pode assim se tornar um ministro bastante vocal em temas importantes para o setor produtivo. Assim, mesmo vindo pelas mãos de um presidente de esquerda, este pode vir a ser fator marcante de sua atuação.
Avesso aos discursos mais à esquerda
Não para menos, integrantes do governo ou apoiadores de Lula no mundo do Direito – alguns deles interessados na vaga –, objetam a indicação de Zanin por não ser alguém de esquerda. E talvez tenham razões para isso. Zanin não é um crítico da reforma trabalhista de Michel Temer (MDB). Pelo contrário. Mesmo que defenda certos aperfeiçoamentos nas relações de trabalho na nova economia.
Na pauta de direitos fundamentais, tampouco sinaliza alinhamento aos discursos mais à esquerda. Por mais que considere acertadas as decisões do Supremo no caso de cotas raciais e aborto de fetos anencefálicos, por mais que sua visão o levasse a concordar com a maioria do tribunal no caso de união homoafetiva (mas com a ressalva de que o pedido era por equiparação à união estável e não ao casamento, como acabou decidindo a maioria), Zanin teria votado contra a criminalização da homofobia. No futuro, pode não estar ao lado daqueles que defenderão a descriminalização do aborto pela via judicial.
Mas desde quando essas são ou foram preocupações fundamentais para Lula? De onde se tira, no passado, que Lula indicaria alguém alinhado com essas pautas de esquerda? Foi ele o presidente que indicou o conservador Menezes Direito para o Supremo. Foi Lula que escolheu Ricardo Lewandowski para o tribunal.
Lembremo-nos: por mais que Lewandowski tenha se alinhado ao petismo em questões políticas e criminais, passavam longe de caminhar com Barroso, Ayres Britto ou Fachin nessas questões de direitos fundamentais. Foi também Lula que escolheu Dias Toffoli – com suas ligações familiares com a Igreja Católica – para o tribunal.
A escolha de Zanin, portanto, pode frustrar esta expectativa da esquerda por um ministro mais conectado com suas pautas. Zanin não será para a esquerda o que André Mendonça é e será para os evangélicos. E fundamentalmente porque isso não era relevante para Lula. O presidente, ao escolher um nome pela nona vez para o STF, foca no que lhe é mais importante. É, pois, uma indicação pragmática de alguém que sentiu na privação da liberdade o preço por suas escolhas.
Por Felipe Recondo, diretor de conteúdo do JOTA em Brasília.