Ministros do TSE veem ‘drible’ à lei eleitoral com PEC que cria benefícios sociais
Magistrados apontam que as medidas podem abrir espaço para que haja abuso no uso da máquina pública
A criação de uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que institui até o fim do ano um estado de emergência para viabilizar a criação e a ampliação de benefícios sociais a três meses das eleições é vista, por uma ala de ministros do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), como um “drible” à lei eleitoral.
No entendimento de parte dos juristas eleitorais, a instituição de um estado de calamidade por meio de PEC para possibilitar a implementação de medidas populares representa desvio de finalidade e fraude à lei, além de ferir princípios constitucionais. Segundo o artigo 16 da Constituição, a lei que “alterar o processo eleitoral” não se aplicando à eleição que ocorra até um ano da data de sua vigência, a chamada regra da anualidade.
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Para uma parte desses magistrados, ouvidos reservadamente pelo jornal “O Globo”, criar artificialmente um estado de emergência poderia abrir espaço para que haja abuso no uso da máquina pública, o que não é desejável. Os ministros ponderam, contudo, que a Corte poderá analisar a matéria sob a ótica da vedação de condutas em ano de eleições – mas apenas caso seja provocado tanto por partidos quanto pela Procuradoria-Geral Eleitoral (PGE), sob o comando de Augusto Aras.
Desde o dia 1º de janeiro deste ano a Administração Pública está proibida de distribuir gratuitamente bens, valores ou benefícios a cidadãs e cidadãos. A exceção só é aberta para atender casos de estado de calamidade ou emergência pública ou para dar andamento a programas sociais previamente existentes, com orçamento em execução.
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A proibição é imposta pela Lei das Eleições para evitar o uso da máquina e de recursos públicos por agentes políticos com o objetivo de alavancar eventuais candidaturas ou de correligionários nas Eleições de 2022.
Um outro ministro do TSE lembra que a definição de estado de emergência por meio de emenda à Constituição já aconteceu antes, com a EC 106/2020, que cuida de medidas para enfrentamento das emergências decorrentes da pandemia. Esse magistrado entende, contudo, que as situações são distintas.
Um jurista que já integrou o TSE ouvido também sob reserva lembra que senadores e deputados podem ser responsabilizados juridicamente pela aprovação da PEC. Isto porque, na avaliação do advogado, são responsáveis por uma conduta que pode ser enquadrada como crime eleitoral, o que poderia levar a futuras cassações e inelegibilidades.
Especialista em direito eleitoral, o advogado Luiz Eduardo Peccinin explica que pela legislação, o TSE pode determinar liminarmente a suspensão imediata dos novos auxílios, por sua clara ilegalidade.
“O problema é que nesses casos nenhum dos legitimados a agir, partidos e pré-candidatos, quer assumir o ônus político de bloquear um benefício social à população às vésperas das eleições. Ainda, verificada a ofensa à lei eleitoral, o TSE também pode punir com multa o Presidente e as demais autoridades por conduta vedada a agentes públicos em campanha”, afirma.
Ainda de acordo com o jurista, caso seja verificada a gravidade e grande impacto dos novos benefícios sobre a igualdade no pleito, pode ser reconhecido o abuso da máquina, o que pode levar à cassação do mandato e a inelegibilidade dos responsáveis e eventuais beneficiários.
“Para isso, contudo, e necessária ação, já que o TSE, como qualquer órgão do Judiciário, não pode atuar de ofício”, aponta.