Nova onda de reajustes de preços avança na indústria e no varejo

Pressões estão em linha branca, alimentos e bebidas, e afetam o comércio eletrônico

Foto: Divulgação

Há uma nova onda de reajustes de preços no mercado de bens de consumo neste segundo trimestre, e isso indica que os repasses feitos nos primeiros meses do ano parecem estar longe de estancar o movimento de aumentos ao consumidor. Nesta semana, fabricantes relataram a investidores necessidade de correções contínuas nas tabelas ao comércio, e varejistas já receberam, nas últimas semanas, sondagens da indústria para reajustes de um dígito alto entre abril e maio, apurou o Valor.

A alta do dólar nos últimos dias, que eleva preço de insumos cotados na moeda americana, reforça a preocupação do setor, após meses de real mais valorizado terem dado algum ânimo às lojas. Ontem, Credit Suisse e J.P.Morgan e revisaram para cima projeções de inflação do ano – apesar da divulgação do IPCA-15 de abril abaixo do consenso – em parte pelos sinais de mais repasses em segmentos como alimentos e bens industriais.

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Segundo fontes ouvidas, esse cenário de novas pressões está mais evidente em produtos de linha branca (refrigeradores e lavadoras), certos alimentos e bebidas de alta demanda, e mesmo em canais em que há maior competição, como o comércio eletrônico. Em março, o Mercado Livre, a maior plataforma de venda on-line do país, anunciou novo repasse de aumento de custos aos lojistas, dizem fontes. O grupo informou uma alta na taxa de comissão sobre a venda de produtos, como de supermercados, após 18 de abril, como reflexo do “contexto macroeconômico”, informou em carta.

No caso da indústria de consumo, parte desse movimento reflete o fim de descontos concedidos na segunda metade de 2021 em cadeias como a do aço, usado na produção de linha branca. Ainda vêm sendo discutido repasses de altas no cobre, alumínio e certos tipos de papelão, principalmente após fevereiro e março. Fabricantes desses materiais alegam que carregam pressões em custos de 2021 que ainda não foram integralmente repassadas às lojas.

“Em abril, a CSN retirou os descontos à linha branca que vinham de 2021, aumentando em 20% as tabelas de aço laminados a frio e os galvanizados. E a Usiminas veio com tabela nova em abril”, diz o diretor de uma indústria de eletrodomésticos nacional. “O problema é que não tem isso de efeito marginal ao consumidor, como as siderúrgicas dizem. Para um fogão de aço inox, o aço é 57% do custo final e fogão ‘de vidro’ [modelo tradicional] está na faixa de 40%. É o material que mais pesa”.

As altas refletem aumento de custos de matérias primas, como o carvão, após início da guerra no leste europeu. Entre fevereiro e março, CSN e Usiminas confirmaram os aumentos ao mercado.

Duas redes de varejo médias ouvidas ontem relataram ter recebido sondagens da Electrolux e da Whirlpool (Brastemp e Consul) para aumentos de 8% a 10% nos preços no segundo trimestre. O que vem chamando a atenção dos executivos é a pressão por repasses integrais, mesmo sem espaço para isso, frente à evidente demanda fraca com a perda no poder de compra da população. A explicação está na necessidade da indústria de bens de consumo recompor margens ao longo de 2022.

“Em janeiro, tivemos reajustes de linha branca da ordem de 3% a 5% e deu uma acalmada. Agora estão vindo com 8% a 10% para valer após maio, a depender da categoria, além de lançamentos ou repaginações de produtos, que entram com preço novo. O que acontecerá é que o mercado de linha branca ficará menor, estimamos que em volume, caia de 4% a 8% em 2022, mas com rentabilidade melhor pelo efeito de novo ‘mix’ e reajustes”, disse o diretor geral de uma varejista de eletrônicos com 75 lojas.

Na terça-feira, o comando da Whirlpool disse a analistas que as vendas na América Latina (onde Brasil responde por mais de metade das vendas) subiram 4% em valor, “impulsionadas por aumentos de preços, compensando a fraqueza esperada da indústria”, afirmou Joseph Liotine, diretor de operações. E num sinal de que a onda de aumentos ainda não deve afrouxar tão cedo, o CEO do grupo, Marc Bitzer, disse, ao citar a operação global, que a empresa “está posicionada para entregar forte segundo semestre, saindo do ano com ações [em mix de itens vendidos e em preços] que compensam totalmente a inflação de custos”.

A divulgação hoje dos resultados de janeiro a março de grandes grupos, como Apple e Samsung, deve confirmar ambiente de repasses aos preços se estendendo a todo o primeiro semestre em mercados maduros e nos emergentes, segundo prévia de bancos em relatórios. No setor de bebidas, a direção da Coca-Cola disse a investidores na segunda-feira que “haverá mais aumentos de preços dependendo de onde você estiver”, afirmou o CEO, James Quincey, ao ser perguntado sobre novos reajustes.

“Quero dizer que há países com inflação em dois dígitos, e você vê vários aumentos de preços durante o ano. É claro que, quando se está nesse tipo de situação, há pressões de custos para passar enquanto procura sustentar as margens”. O executivo não cita países onde há essa pressão, mas no Brasil o IPCA está em 10,54% até fevereiro.

No segmento eletroeletrônico, que, como linha branca, é afetado pela alta dos juros e tem insumos dolarizados, o recuo de cerca de 18% da moeda estrangeira desde janeiro vinha criando uma “janela” de compra de novos estoques a preços mais baixos. Como as vendas dessas linhas está em desaceleração desde setembro, esse ganho vem sendo comemorado no setor. Mas com a recente alta do dólar, nos últimos dias, o receio é essa instabilidade volte a encarecer as compras, dizem analistas. Em uma semana, a moeda subiu 6,5%.

Procuradas, Electrolux e Whirlpool não se manifestaram. O Mercado Livre informou que, por conta do cenário econômico, foram feitas atualizações de políticas e custos de vendas para produtos de consumo massivo, como de supermercados. Reforça ainda que segue “firme com compromisso de democratização do comércio” e geração de renda e emprego.

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