Pejotização: entenda decisão do STF que suspende ações trabalhistas em todo o País

Processos que questionam a pejotização e pedem reconhecimento de vínculo trabalhista ficam suspensos até que o plenário do STF julgue o tema

Devem ser suspensos todos os processos judiciais do Brasil que tratem da chamada “pejotização”, a contratação de trabalhadores autônomos na modalidade pessoa jurídica (PJ). Este é o efeito prático da decisão do ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal (STF), assinada na segunda-feira (14).

O ministro decretou a suspensão nacional após os demais ministros do STF decidirem que o tema possui repercussão geral.

O que é repercussão geral
Um tema de repercussão geral ocorre quando o Supremo Tribunal Federal julga um caso com efeito em todos os casos semelhantes no País. Ou seja, o STF interpreta a Constituição e as leis e define um entendimento único para o tema, que deve obrigatoriamente ser seguido por todos os tribunais.

Neste caso são realmente muitos processos. De acordo com levantamento da plataforma Data Lawyer, há mais de 1,3 milhão de ações na Justiça do Trabalho pedindo o reconhecimento de vínculo empregatício. Todos esses processos ficam agora suspensos aguardando a decisão final do STF.

São profissionais como advogados, médicos, jornalistas, publicitários e muitos outros que prestaram serviços como PJ. O pedido é que a Justiça reconheça que, na verdade, a relação existente era a de vínculo empregatício. Assim, determinando que a empresa pague os direitos previstos pela CLT, como INSS, férias e décimo terceiro.

Por outro lado, as empresas seguem no pleito de que esse modelo de contratação é válido e segue o que a lei já decidiu sobre a terceirização. Portanto, que o acordo de prestação de serviços foi consensual e deve ter reconhecimento legal. Esse é o dilema recorrente de muitos processos judiciais, com decisões distintas.

O que acontece agora com a pejotização?

Até segunda ordem, nada muda, explica Poliana Banqueri da Silva Guimarães, advogada trabalhista, sócia do Peixoto & Cury Advogados. Em entrevista à Inteligência Financeira, Guimarães explica que todos os processos ficam suspensos até segunda ordem e que não há prazo para o STF tomar uma decisão.

A advogada explica que ocorrerá algo semelhante ao que aconteceu entre julho de 2019 e dezembro de 2022, quando estiveram suspensas todas as ações que tratavam de questionamento às negociações coletivas.

Quando o Supremo concluiu o julgamento e definiu que eram válidas as negociações que previam regras mais restritivas que a norma geral tudo voltou a andar. Agora, com o chamado efeito vinculante. Efeito vinculante é a obrigação de que todos os juízes do Brasil, independentemente das suas visões pessoais, sigam o entendimento do STF.

“Você tira um pouco essa autonomia do juiz, mas por outro lado você garante segurança para as pessoas e as empresas que essa condição é válida. É uma forma de buscar uniformização”, explica Poliana Guimarães.

Por que o STF vai julgar a validade da pejotização?

O Supremo Tribunal Federal já tomou decisões que tratam de assuntos correlatos, como a validade da terceirização. Contudo, explica a advogada trabalhista, há hoje uma profusão de decisões em diferentes sentidos, o que o ministro Gilmar Mendes menciona em sua análise.

Parte dos magistrados entende que as atuais decisões não permitem a chamada pejotização. De acordo com Poliana Guimarães, é frequente que juízes considerem que, pelo viés trabalhista, contratos de prestação de serviço como PJ são fraudulentos.

Diante do impasse, tanto empresas quanto trabalhadores recorrem ao Supremo.

“O STF tem tido uma sobrecarga de trabalho nessa questão, por estar sendo muito acionado para julgar esse tema”, explica a advogada.

De acordo com Guimarães, hoje a tendência dos julgamentos na suprema corte tem sido de validar os acordos de pejotização. “O STF vem em uma linha de validar esses contratos. Se a lei prevê e não há indício de fraude, o Supremo tem tratado esses acordos de prestação de serviço como legais”, afirma.

O caso que levou o STF a julgar o tema

Sempre que o STF decide dar repercussão geral a um tema isso acontece em decorrência de um caso concreto que chegou ao tribunal. Nessa questão particular, trata-se de uma ação judicial movida por um corretor de seguros contra a corretora Prudential.

Na ação trabalhista, este homem alega que, embora tivesse um contrato de prestação de serviços com a empresa, ele foi na prática um empregado da corretora.

Para tanto, o corretor alega que tinha elementos de uma relação de emprego, incluindo subordinação e pessoalidade. A Prudential nega e defende que o acordo seguia o modelo de franquias, algo que a empresa afirma que é previsto em lei e distinto de um emprego.

As decisões da Justiça até agora foram distintas. A primeira instância da Justiça do Trabalho negou o vínculo.

O corretor recorreu e o Tribunal Regional do Trabalho (TRT) deu ganho de causa a ele, reconhecendo a relação de emprego. Por fim, o caso chegou ao Tribunal Superior do Trabalho (TST), que mudou o entendimento mais uma vez e retomou a decisão original do primeiro juiz.

Diante da derrota no TST, o empregado levou o caso ao Supremo, com Gilmar Mendes assumindo como relator. O ministro decidiu propor aos colegas a repercussão geral, que os demais membros do STF reconheceram em plenário.

“É de notório conhecimento que a matéria objeto do presente recurso – legalidade da contratação de profissional autônomo ou de pessoa jurídica para a prestação de serviços – tem sido recorrente nesta
suprema corte, que diariamente recebe inúmeros casos sobre a questão, especialmente por meio de reclamações constitucionais”, escreveu Gilmar Mendes.

“Diante desse cenário, entendo que o reconhecimento da repercussão geral da matéria, seguido posteriormente pela apreciação do mérito pelo plenário do STF, contribuirá para a pacificação da questão”, concluiu.

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