Marketplaces tentam equilibrar custo maior e competitividade

Mercado Livre, Magazine Luiza, Americanas, Via e Amazon alteraram regras de preços em suas plataformas para equilibrar pressões em suas despesas, como o aumento da conta de combustível e da mão de obra

Fonte: Pixabay
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Há uma nova disputa sendo desenhada entre os grandes marketplaces no país, depois de mudanças anunciadas pelas companhias aos lojistas que expõem produtos nessas plataformas. O movimento pode definir um outro cenário de competição nos próximos meses, num ambiente de demanda afetada por inflação e perda de renda.

Depois de Mercado Livre, Amazon e Via (dona de Casas Bahia e Ponto), como antecipado pelo Valor em janeiro, agora Magazine Luiza e Americanas alteraram regras de cobranças em suas plataformas. A Americanas decidiu ficar mais agressiva na venda de alimentos e bebidas, que trazem frequência de clientes, e também ampliou subsídios aos vendedores. Mas aumentou a taxa de comissão sobre venda para até 19%. O Magazine comunicou aos varejistas parceiros a adoção de frete grátis em todos os seus canais, mas criou uma cobrança que antes não existia e reduziu subsídios.

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Os ajustes ocorrem num ambiente em que as plataformas tentam equilibrar pressões em suas despesas, como o aumento da conta de combustível — que eleva os gastos com frete — e da mão de obra desde 2021. Há empresas optando por defender rentabilidade e outras, sendo mais competitivas.

O marketplace é um intermediário na venda, que precisa do vendedor para ter tráfego e ser relevante, mas que, em períodos de aumento de custo de capital e de inflação, tem que gerenciar os seus próprios resultados. Mais de 70% das vendas da Americanas vem da área digital — e os vendedores parceiros são 40% desse número. No Magazine, o on-line representa 72% das vendas, e o marketplace, 35% do comércio digital. No Mercado Livre, analistas estimam que mais de 80% da venda são de lojistas parceiros.

Em e-mail enviado a lojistas, o Magazine diz que tomou “decisões importantes” para “ajustar ritmo de gestão de vendas” . É a segunda mudança em regras em cinco meses — a última foi em setembro, antes da piora no ambiente de venda no digital. Já a Americanas fala em “aumentar a competitividade”, com sinais de posição mais combativa em algumas categorias.

Em dezembro, o Mercado Livre informou a vendedores redução nos planos de parcelamentos sem juros, aumento no prazo de pagamento das vendas realizadas ao lojista parceiro e redução ou eliminação do subsídio no frete das entregas feitas pela empresa, num sinal de maior racionalidade. No fim de 2021, a Via elevou a comissão em até cinco pontos sobre 2020.

Especialistas dizem que todas as plataformas estão repassando parte de aumentos de custos aos vendedores, mas cada uma está mudando as regras segundo a sua estratégia no mercado digital e o seu fôlego de caixa. Além disso, ainda veem um “efeito Shopee” nas mudanças, a plataforma asiática que avança rapidamente sobre o país, especialmente pelo fim de taxas que lojistas pediam há meses.

Na mensagem a lojistas, a Americanas informa que a comissão agora varia de 12% a 19% sobre o valor do item — antes era de 16% para todos os segmentos. Os 16% se mantêm em alguns setores (telefonia, eletrônicos, games), mas em suplementos, beleza, esporte e lazer, por exemplo, foi para 17%. Para relógios, moda e malas, a taxa sobe de 16% para 19%.

A maior parte dos setores teve alta na comissão. Porém, em alimentos, bebidas e pets o percentual caiu para 12%. São segmentos com tíquetes baixos, mas que atraem tráfego, principal foco dos marketplaces hoje.

Essas taxas são cobradas de lojistas que usam ou não a estrutura de entrega da Americanas, mas estes últimos agora pagam comissão sobre o valor de frete. Antes, isso não era cobrado — a regra mudou em 1 de fevereiro. “Ao aumentar a taxa, a Americanas está equilibrando a comissão para o mesmo nível de Mercado Livre, Via e Magalu. Antes estava fora da média”, diz um vendedor de itens de perfumaria.

Ainda houve outra alteração, que pode “aliviar” o efeito dessa comissão maior. Até janeiro, nos produtos abaixo de R$ 40 era cobrada uma taxa fixa de R$ 5 sobre o item vendido, e esse valor deixa de ser cobrado, numa ação considerada agressiva, já que a maioria das rivais cobra esse tipo de taxa. Também deixa de existir comissão sobre pedidos cancelados pelo cliente, no caso de entrega feita pela estrutura da Americanas.

Apesar da comissão sobre frete, os lojistas de alimentos, bebidas e itens para pets não vão pagar essa taxa, num outro esforço para acelerar a venda desses produtos.

Na sexta-feira, a companhia mencionou a analistas alterações em suas políticas, mas sem detalhar. A direção mencionou que a ideia foi “trazer mais inteligência, mas de maneira que, no fim das contas, o “economics” ficasse estável”. Uma mudança que lojistas ouvidos destacaram foi o aumento do subsídio ao frete para lojas que usam a estrutura de entrega da empresa. A taxa subiu de 60% para 80% em itens leves, e nos pesados (geladeiras, lavadoras), subiu de 35% para 55%.

“Produtos que antes não tinham subsídio em frete, com mais de 29 quilos e que custam de R$ 40 a R$ 79,99, agora têm subsídio”, disse uma fonte. A empresa fez reforço de caixa em 2020, com debêntures e ofertas de ações, e avançou na recente integração do on-line e de suas lojas. Esse cenário pode tornar a Americanas mais preparada para absorver os subsídios na sua conta.

No caso do Magazine Luiza, as mudanças foram informadas aos varejistas no fim de janeiro, pouco mais de um mês após o Mercado Livre ter relatado alterações. A empresa passou a oferecer a opção de frete grátis, antes apenas para pedidos no “app”, agora também para o site (para lojistas que usam o Magalu Entrega ou despacham produtos nas lojas). Cerca de cinco meses atrás, quando fez as últimas mudanças, a empresa dizia que não alteraria essa regra.

“Isso torna o Magalu mais competitivo na venda de eletro e telefonia pelo site, canal que muita gente ainda usa para compras mais caras. Como o eletro perdeu força, pode ser que Magalu esteja tentando melhorar essa venda”, diz um consultor de marketplaces.

Essas condições são válidas para produtos acima de R$ 79 e com valor de frete até R$ 50 (pelo Magalu Entrega). Antes, a opção de frete grátis valia para frete de até R$ 70, o que incentivava as vendas para o Norte e Nordeste.

“Apesar da mudança, eles dizem que os R$ 50 cobrem quase todo o Brasil”, diz um lojista que contatou a rede. “Tem que pensar que, por outro lado, a possibilidade de ter frete grátis a todos os canais tem impacto positivo. Todos os ‘sellers’ questionavam isso, mas eles diziam que não mudariam”.

Houve, porém, uma piora na política de coparticipação de desconto no frete (nas compras acima de R$ 79). Até janeiro, se o parceiro entregasse mais de 97% dos pedidos no prazo, não pagava nada de frete (100% de desconto), mas o desconto caiu para 75%.

De 97% a 87%, o desconto diminuiu de 50% para 40% (mesmo percentual do Mercado Livre). Nessa faixa está a maior parte dos lojistas da empresa. Para quem está abaixo de 87% no critério de entrega, o desconto é nulo — ou seja, o lojista paga tudo. Isso é válido desde 1 de fevereiro.

“O que o Magalu diz é que, no fim das contas, o frete pago pelo vendedor ainda está muito baixo por causa do desconto. E é verdade, só que antes o subsídio era de 100%. É isso que o lojista lembra”, diz um consultor de marketplace.

Segundo um varejista médio ouvido, é uma exigência que leva a uma seleção natural. “Se o lojista conseguir nota alta [acima de 97% de entregas no prazo], ele obtém a melhor vantagem entre os marketplaces do setor”, diz. “Mas a questão é que para ficar acima de 97%, não se pode atrasar quase nada, só 3 a cada 100 pedidos. É algo bem difícil”, diz esse varejista.

A ideia do Magazine é reduzir prazos para tentar fechar mais o “gap” em relação a outros concorrentes — e o Mercado Livre é uma das referências no setor ao considerando o tamanho de sua operação. Ainda quer ir “educando” o lojista a operar de forma mais eficiente — a conversão de visitas em vendas aumenta 40% quando se reduz entrega de 3 para 2 dias.

Os marketplaces dependem que o lojista abrace essa ideia para que a plataforma ofereça melhor nível de serviço que as rivais, mas não pode fazer isso sem equilíbrio, para não perder lojistas importantes ou com potencial.

Além de aumentar a coparticipação do frete, o Magazine criou nova cobrança: todos os pedidos passam a ter um custo de R$ 3 para o lojista (nas encomendas acima de R$ 10) desde 15 de fevereiro. Isso se soma ao valor da comissão.

No Mercado Livre há R$ 5 a mais para compras de até R$ 79. A Americanas, desde fevereiro, acabou com o custo de R$ 5 em compras acima de R$ 40.

O Magazine ainda aumentou a taxa de comissão no Parceiro Magalu, para lojistas que vendem valores baixos (muitos usam CPF). A taxa foi de 3,99% para 5,8% sobre a venda, para lojista que fatura até R$ 100 mil ao ano. De R$ 100 mil a R$ 300 mil, o percentual mais que dobra, atingindo 8,8%, e acima de R$ 300 mil, o lojista já passa para a regras do marketplace tradicional. Vendedores já esperavam encarecimento do Parceiro Magalu. No marketplace da rede, a comissão se manteve em 16%, em média.

Entre as mudanças, o Magazine ainda determinou que pedidos com o pagamento aprovado até as 10h devem ser despachados no mesmo dia. Em setembro, na última alteração de regras, a empresa disse que não seguiria essa política. Pedidos aprovados após este horário permanecem com prazo de despacho de um dia útil.

Procurado, o Magazine Luiza confirma as mudanças. A empresa está em “período de silêncio”, que antecede a divulgação de seu balanço, e não fez mais comentários.

“Eles mudaram e estão fazendo o que o Mercado Livre fez lá atrás, dando horário de corte. E se passar da hora e não enviar, cai a nota [do lojista] e piora a sua coparticipação. Isso é, de novo, uma forma de fazer o ‘seller’ ser mais ágil”, diz um vendedor de itens de saúde.

O Valor conversou com oito lojistas de Magazine, Mercado Livre e Americanas e todos afirmam que os mecanismos dos marketplaces estão mudando várias vezes ao ano. E está mais difícil acompanhar tantos ajustes. Todas as empresas mudaram condições pelo menos uma vez de um ano para cá.

“Cada vez que um marketplace muda, temos que precificar tudo de novo. É claro que isso é do jogo, mas não é só porque eles querem simplificar as coisas para nós. Eles estão tentando achar um modelo para vender mais, mas não é fácil hoje”, diz o diretor da loja on-line de produtos para saúde.

Outra crítica envolve o teor de certas regras. “Todo mundo fala que não dá “copy page” no que os concorrentes fazem, mas tem coisa copiada. Porque todas seguem o limite de R$ 79 para dar frete grátis? Isso começou com o Mercado Livre. Todo mundo tem a mesma estrutura de custo e de logística para ter a mesma nota de corte?”, pergunta um lojista de itens óticos.

O Magazine ainda informou aos terceiros que, para novos contratos, o lojista novato, que entrar agora na plataforma, cairá automaticamente na melhor faixa de desconto, de 97%, uma forma de tentar atrair mais parceiros, um dos focos da estratégias das plataformas atualmente.

“Na Americanas, quem entra, começa na pior faixa de desconto. Nesse sentido, é bom o que o Magalu faz porque incentiva quem está começando, apesar de o lojista antigo não gostar nada disso”, diz o lojista do setor ótico.

Com Valor Pro, serviço de informação em tempo real do Valor Econômico.

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