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Incertezas no cenário econômico levam bancos a revisar avaliações
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Os analistas ainda esperam bons desempenhos da maioria das companhias no quarto trimestre e início do próximo ano
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PIB menor, real desvalorizado e alta nos juros são motivos para a redução nos preços-alvos das ações
A piora recente nas premissas macroeconômicas, com projeção de crescimento zero no Produto Interno Bruto (PIB) em 2022 e escalada na taxa básica de juros para conter a alta na inflação, causou um movimento de forte revisão na avaliação das empresas por parte dos bancos e casas de análise nas últimas semanas.
Apesar de os fundamentos estarem em grande parte inalterados, com analistas ainda esperando bons desempenhos da maioria das companhias no quarto trimestre e início do próximo ano, as incertezas trazidas pelos cenários político e econômico tiveram que ser ponderadas nos preços dos ativos.
O método mais usado para isso é o fluxo de caixa descontado, que consiste em trazer os fluxos de caixa futuros das empresas para o presente, descontados pela taxa de juros. Com a Selic subindo de 2% ao ano em janeiro para 9,25% ao ano em dezembro, o impacto nas avaliações foi grande.
A combinação de menor crescimento do PIB, desvalorização do real e alta nos juros é a receita perfeita para a redução, principalmente nos preços-alvos das ações das empresas. As recomendações, diz André Mazini, analista do Citi, mantêm-se inalteradas, pois é o momento para escolher nomes de boa qualidade e que estejam com preços descontados.
O movimento de revisão nos preços-alvos não é algo que acontece só no Brasil. Jennie Li, estrategista de ações da XP, comenta que a alta dos títulos do governo dos Estados Unidos, os “Treasuries”, também causou volatilidade nas avaliações lá fora, apesar de ter sido em intensidade menor do que no Brasil, por não ter os riscos embutidos de mercado emergente.
“O que movimentou as revisões por aqui foi a alta no risco fiscal, com a PEC dos Precatórios, elevando os juros longos na comparação com um cenário do começo do ano, quando estavam em torno de 7%”, diz. Como os juros longos são usados no cálculo de avaliação da empresa, quanto maiores eles ficam, maior a taxa de desconto, o que reduz o preço-alvo.
Pedro Serra, gerente de pesquisa da Ativa Investimentos, diz que muito do descompasso entre os preços dos papéis, descontados, em relação aos preços-alvos e ao desempenho operacional das empresas, acontece pela falta de expectativas do cenário econômico e político.
“O mercado vem precificando algo muito ruim que é a percepção de que o Banco Central (BC) correndo atrás da curva de juros não está ancorando expectativas e ninguém sabe até onde os juros e a inflação vão subir”, diz. “Isso cria um ambiente de incerteza que o mercado detesta, prejudicando o planejamento dos gestores.”
Apesar de ter arrefecido nas últimas semanas, os analistas sabem que a volatilidade vai continuar ao longo de 2022. “O governo já mostrou que vai continuar pressionando gastos agora que o mecanismo do teto foi descartado e vamos estar em um contexto de eleições que serão contenciosas”, diz Li.
“No ano que vem teremos a combinação de endividamento, inflação e corrosão do poder de compra”, diz Serra. “É a tempestade perfeita, com o mercado antecipando muita coisa, como eleições, o que traz essa volatilidade além dos problemas estruturais que já são existentes.”
Mazini, do Citi, acredita que os riscos são mais estruturais do que eventos passageiros. Ele cita a decisão recente do Federal Reserve, o banco central americano, em antecipar a retirada nos estímulos econômicos, o que pode chacoalhar os mercados emergentes.
Se em termos técnicos há muita volatilidade envolvendo as empresas, operacionalmente o quarto trimestre ainda deve ser positivo. Os analistas destacam que a estabilização do preço do minério, após forte queda no terceiro trimestre, e o petróleo continua em patamares elevados, favorecendo empresas do setor de commodities.
“Não espero mais grandes pulos nas commodities porque houve uma estabilização nas cadeias de distribuição”, diz Mazini. “Antes elas eram muito espalhadas e houve um movimento de adensamento, o que aumentou a resiliência, reduzindo dependência de países como a China.”
A alta na inflação pode impactar o resultado de empresas do setor de consumo, principalmente o discricionário e ligado a baixa renda, diz Serra. “A Black Friday foi mais fraca que o esperado e a expectativa agora é esperar para ver como será o Natal, que até pode ser bom, mas virá abaixo do projetado.”
Para Mazini, os shoppings devem manter o bom desempenho visto no terceiro trimestre, com algumas empresas já conseguindo cobrar totalidade dos aluguéis.
Os analistas ressaltam que a continuidade da alta na taxa de juros pode afetar o resultado financeiro de empresas com alto grau de endividamento e também o mercado imobiliário, com os bancos atrelando taxas do financiamento habitacional sobre a Selic.
O mercado imobiliário de alta renda é mais resiliente, diz Thais Alonso, do Citi, enquanto o de baixa renda tem o programa Casa Verde e Amarela. Já as empresas que atuam na média renda devem sentir impactos da alta nos juros. “O momento é um pouco menos animador, clientes de média renda já começam a fazer conta e ponderar se vale a pena comprar uma casa ou apartamento, e essa deterioração do sentimento do consumidor será sentida no trimestre”, diz.
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