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Mercado teme que proposta de arcabouço fiscal seja desidratada
O adiamento da viagem do presidente Lula (PT) à China aumenta a expectativa pela apresentação do novo arcabouço fiscal por parte do mercado. A demora no anúncio faz os analistas temerem que a proposta seja desidratada e não seja dura o suficiente para diminuir a trajetória da dívida pública e para as expectativas de inflação voltarem a girar próximo da meta.
Esse foi o principal motivo alegado pelo Comitê de Política Monetária (Copom) para manter, na última quarta-feira, a taxa Selic em 13,75% ao ano e sinalizar que pode até voltar a subir os juros.
“O adiamento dá a entender que pode estar tendo uma discussão dos pontos mais sensíveis, especialmente sobre gastos sociais. O importante é sair o mais rápido possível, porque isso abriria espaço para corte de juros mais à frente, caso seja um arcabouço crível”, afirma Flávio Serrano, economista da gestora Blueline.
O economista ressalta que é importante que a regra estabeleça um menor número de exclusões possíveis e que garanta uma redução do endividamento público.
“A questão é criar várias exceções e se haverá uma brecha para gastar. O problema não é gastar, mas é que gastamos muito mal nos últimos anos e está sobrando pouco espaço no Orçamento para os investimentos. Temos pouco espaço para manobra.”
Previsão de reajuste real
Serrano ressalta que a economia se recuperou com a abertura da atividade depois da pandemia e com a arrecadação maior vinda do avanço dos preços das commodities e do repasse de dividendos à União. Esse cenário favorável não deve voltar a acontecer este ano.
“O endividamento vai voltar a subir. Se houver uma regra na qual os agentes enxerguem uma estabilização da dívida até 2026, 2027, isso já seria importante. A percepção do mercado é que se precisa de algo minimamente crível. A demora em si pode criar a expectativa de uma regra mais fraca, mas temos que esperar.”
O head de pesquisa macroeconômica da Kínitro Capital, João Savignon, diz que os investidores seguem céticos em relação ao novo marco fiscal.
“O que vimos nas últimas semanas é a possibilidade de mais cláusulas de escape, principalmente para gastos com saúde e educação e, de forma geral, para os investimentos, que podem incluir o PAC, por exemplo. Isso inviabilizaria o ajuste necessário das despesas, tornando o esforço fiscal com a nova regra muito dependente das receitas.”
Nesse sentido, Savignon afirma que a regra fiscal deveria ser simples, previsível e impositiva.
“Já sabemos que as despesas vão crescer em termos reais. A questão é o quanto elas vão crescer com o novo arcabouço. O governo vem sinalizando reajustes reais anuais para o salário mínimo e para servidores e que os gastos com saúde e educação são investimentos, isto é, podem ter uma regra diferenciada.”
E a proposta ainda deve passar pelo Congresso Nacional. O economista-chefe da Oriz, Marcos De Marchi, pondera que o presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL), tem sinalizado que defenderá regras mais rígidas, caso ela venha mais flexível.
“Nada adianta o governo falar que o arcabouço fiscal prevê um crescimento de 3% ao ano, se isso não vai ocorrer, ou se o governo trabalhar com juro real de equilíbrio muito baixo.”
Ele avalia como difícil a missão de já zerar o déficit público em 2024, como tem previsto o governo, diante da resistência da ala política.
Para especialistas, a apresentação da regra fiscal contribui para estabilização das expectativas de inflação. Com isso, abre-se a porta para redução dos juros no segundo semestre deste ano.
O economista-chefe da Oriz destaca que a regra também pode ajudar no desempenho positivo dos ativos domésticos, mesmo que não seja o sonho de consumo dos investidores.
“Ainda que haja ceticismo do mercado se a proposta vai parar de pé, há bastante gente que avalia que o Haddad (Fernando, ministro da Fazenda) está com boa vontade em relação ao assunto.”
Por Vitor da Costa
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