Empresas correm para elevar estoques de diesel, e governo estuda criar plano de contingência

Já no próximo mês a demanda pelo combustível poderia superar a oferta

Foto: Brenno Carvalho/Agência O GLOBO
Foto: Brenno Carvalho/Agência O GLOBO

Diante do risco de falta de diesel no segundo semestre, as principais distribuidoras estão aumentando seus estoques, de acordo com executivos e fontes do setor. Na Vibra (ex-BR), a maior empresa do país no segmento, o volume armazenado aumentou preventivamente de sete para nove dias de consumo. Raízen e Ipiranga também estão guardando uma quantidade maior, ampliando o estoque de três para quatro dias, de acordo com fontes. O assunto também preocupa o governo, que estuda criar um protocolo de crise para o abastecimento de diesel.

O temor das empresas é motivado por um cenário que conjuga expectativa de crescimento maior do PIB do que o previsto anteriormente — o que significa consumo maior de combustível —, previsão de uma das piores temporadas de furacões no Golfo do México nas últimas décadas, fim do lockdown na China (o que estimula a economia global e a demanda pelo produto) e aumento do embargo efetivo ao petróleo russo.

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Segundo o relato de participantes das últimas reuniões do Comitê de Monitoramento do Suprimento Nacional de Combustíveis e Biocombustíveis, no âmbito do Ministério de Minas e Energia, chegou a ser apontado que já no próximo mês a demanda por diesel poderia superar a oferta, o que inclui tanto a produção nas refinarias quanto a importação.

Mais biodiesel na mistura

Diante deste cenário, o protocolo de crise em estudo no governo visa a garantir a importação com antecedência, além da segurança de que os estoques sustentem o consumo. A iniciativa também daria prioridade para o abastecimento de infraestruturas críticas, como carros de polícia, veículos ligados à saúde e transporte de alimentos.

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A ideia é garantir a integração entre distribuidoras e importadores, além de medidas para atender rapidamente regiões com menor estoque e maior demanda. Experiência similar foi adotada no país durante a greve dos caminhoneiros, em 2018.

Mas esta não é a única hipótese na mesa. O foco no momento é ampliar estoques. Cerca de 30% dos volumes consumidos no país dependem de importação. Um estrangulamento global no fornecimento de combustível afetaria diretamente o país.

Outra opção em discussão é elevar o percentual do biodiesel no diesel, o que seria uma forma de ampliar a disponibilidade de combustível no país. Hoje, a mistura está em 10% e poderia ser elevada a 12%. O setor afirma ter capacidade de responder com aumento de produção de 1,2 bilhão de litros em 30 a 45 dias.

Essa alternativa, porém, esbarra em outros entraves. O ministro de Minas e Energia, Adolfo Sachsida, é historicamente a favor de reduzir a mistura dos biocombustíveis na gasolina e no diesel, e não de aumentá-las. Além disso, o governo teme que a mudança eleve o preço final do produto, no momento em que o controle de preço dos combustíveis se tornou uma meta do governo antes da eleição.

No governo, a preocupação maior é com os postos de bandeira branca, que não têm escala na importação. No caso das grandes distribuidoras, elas adotam contratos de longo prazo e de maior volume.

Até agora, o que se constata no dia a dia é falta pontual de combustível, em alguns pontos, como na saída do Rio. O caminhoneiro Ronaldo Bento disse não ter conseguido abastecer com diesel na semana passada em dois postos próximos à Via Dutra, na altura de Belford Roxo, quando ia entregar uma carga em Teresópolis.

“Com o preço alto do diesel, imagino que os postos não queiram comprar muito e fique escasso”, opinou. O caminhoneiro autônomo Nasareno da Silva também já teve dificuldade momentânea para encher o tanque. “Quando vi que não tinha como abastecer acabei indo em um posto próximo.”

Um relatório da Agência Nacional do Petróleo (ANP) estima que as vendas de diesel nos primeiros quatro meses do ano chegaram a 20 milhões de metros cúbicos, o maior volume para o período já registrado na série histórica, que começou no ano 2000. E representa alta de 2,07% em relação ao período de janeiro a abril do ano passado. Os maiores percentuais de aumento do consumo foram vistos no Centro-Oeste (5,34%), no Norte (8,44%) e no Sudeste (2,37%).

Defasagem de 6%

No texto, a ANP cita o índice ABCR, que mede o fluxo de veículos nas estradas com pedágio no país, calculado pela Associação Brasileira de Concessionárias de Rodovias, que aponta aumento de 22,2% em abril na comparação com igual mês do ano passado.

A tendência é que o ritmo de vendas de diesel siga forte no segundo semestre, segundo Valeria Lima, diretora executiva de Downstream (Abastecimento) do Instituto Brasileiro de Petróleo (IBP).

“O segundo semestre está alinhado com a safra. Se ela vier boa, vai ter demanda maior. Temos trabalhado junto com o MME e a Empresa de Pesquisa Energética (EPE) para monitorar o mercado. Não tem risco de desabastecimento no curto prazo. Os agentes têm se mostrado eficientes”, afirma, acrescentando um alerta. “Não dá para brincar com isso, pois quando se fala de controle de preço, isso representa um risco para o país.”

A Petrobras informou, em nota, que contribui para o planejamento da oferta de combustíveis, considerando os cenários do mercado doméstico e internacional. E lembrou que o Brasil terá “situação desafiadora no segundo semestre, já que é época de colheita agrícola e aumenta o consumo para o transporte da safra”.

Historicamente, o estoque geral de diesel no Brasil sempre oscilou entre 13 e 15 dias. Hoje está em torno de 20 dias, segundo as empresas. Na semana passada, o MME informou que os volumes armazenados do óleo diesel S10 (o menos poluente) somavam 38 dias de importação. Ou seja, se as compras do exterior fossem suspensas, os estoques e a produção nacional seriam suficientes para suprir o país por 38 dias. Somente a Petrobras representa cerca de 45% de toda a importação no país.

Segundo a Abicom, associação dos importadores, a defasagem no preço do diesel persiste após o reajuste de 8,9% em maio. Ontem, a diferença de preço entre o valor cobrado pela Petrobras e o mercado internacional era de 6% (ou R$ 0,33 por litro).

Sergio Araujo, presidente executivo da Abicom, lembrou que não há importações de empresas independentes em razão da falta de previsibilidade nos preços da Petrobras, o que amplia a incerteza no setor. Procurado, o MME não comentou.

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