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Conheça o programa do Citi que prepara herdeiros para sucessão
Aos sete anos, Luiza Franceschette tinha uma preocupação incomum para a suaidade. Sabia que as variações do dólar interferiam no humor do pai, Aquiles Franceschette, fundador da fabricante gaúcha de fertilizantes Ourofertil. “Eu queria aprender para ajudar o meu pai. Aprendi que não vou conseguir prever o dólar, mas percebi que não tinha como escapar. A partir do momento em que percebi que eu tinha um título, que carrega as responsabilidades e o privilégio de viver com ele, foi uma virada de chave e me apropriei muito do papel de acionista.”
A reflexão de Luiza, hoje com 25 anos, exemplifica um dilema que herdeiros vivenciam ao nascer “em berço de ouro”, como ela mesma diz, mas com vontade de ocupar o seu espaço na sociedade. A sucessão é um dos pontos mais sensíveis para os grupos empresariais familiares, que se deparam com um duplo desafio: transferir a gestão de seus negócios para as novas gerações e ao mesmo tempo preservar o legado patrimonial.
Fechar algumas lacunas nessa transição e construir relacionamentos com as novas gerações são alguns dos objetivos do Citi no seu programa de treinamento de futuras lideranças. Na quarta edição do seu “winter training”, realizada virtualmente no ano recém-encerrado e com atraso de alguns meses por causa da pandemia, o banco reuniu jovens de diversas localidades do país, ligados a companhias com faturamento anual a partir de R$ 250 milhões.
Ao longo de duas semanas, eles puderam refletir sobre o futuro do trabalho, transformação digital e a nova economia, tópicos associados à responsabilidade ambiental, social e de governança (ESG, na sigla em inglês), além da mentalidade do acionista em tempos turbulentos, um caldeirão que ganhou relevância no mundo pós-covid 19. “Ser acionista de empresa familiar é um trabalho. Independentemente do caminho que seguir, a pessoa tem que se preparar”, diz Bruna Tokunaga Dias, sócia da Cambridge Family Enterprise Group, num desses encontros. Trata-se de uma posição que carrega benefícios e responsabilidades, afirma MelissaCuppari, conselheira sênior da Cambridge.
“Há dividendos, reconhecimento, segurança financeira, acesso à educação de qualidade, sentimento de propósito e de pertencimento”, lista a especialista, acrescentando que, de outro lado, não há como fugir do compromisso com a sustentabilidade de longo prazo do empreendimento, de alinhar interesses dos diversos participantes da cadeia — funcionários, comunidade, fornecedores e demais acionistas —, além da definição dos principais direcionamentos estratégicos.
Durante o encontro, Luiza diz que foi preciso criar dentro da família a noção de carreira, já que o pai foi o principal executivo da companhia na maior parte da vida. A primeira vez que participou do programa do Citi foi em 2019 e acabou sendo um divisor de águas para a sua transição acadêmica para a jornada profissional.
“Foi importante em diversos aspectos ao permitir que eu me apropriasse do meu espaço de sucessora, me fez perceber a diferença entre ser acionista e ser executiva. Foi o ambiente onde tive acesso ao conhecimento técnico sobre o que é ser um acionista de empresa privada, algo que não se vê na universidade.” Foi também o primeiro espaço de contato da jovem formada em administração de empresas com outros herdeiros.
Pedro Luis Junqueira de Figueiredo, do grupo de usinas de açúcar do Paraná Lincoln Junqueira, diz que se confrontou com resistências dentro do próprio núcleo familiar para que os herdeiros da terceira geração atuassem no negócio. Experiência parecida narra Deborah Seleme, integrante da terceira geração da fabricante de couro Viposa, de Santa Catarina. “A gente ouve: ‘olha a piazada chegando’, tem que lidar com isso. Ideias não têm idade.”
Outro jovem presente no encontro compartilha um aprendizado que teve com a tia: “Ela costuma dizer: ‘você nunca vai conseguir esconder de quem é filho, sobrinho, vai ser o filho do dono sempre. Pode ser o que trabalha lá para bater meta, dar resultado, ou o filho do dono que não trabalha.” Com maturidade peculiar para alguém na faixa dos 20 e poucos anos, ele sabe que esse estigma sempre vai existir, mas sinaliza querer ser um acionista que “dá a cara a tapa, entrando mais cedo e saindo mais tarde do que todo mundo”, e acredita que um bom trabalho vai ser reconhecido. Como modelo, cita o CEO do Magazine Luiza, Frederico Trajano, filho de Luiza Trajano, um dos executivos responsáveis pela virada operacional e toda a transformação digital da varejista nos últimos anos.
Trajetória
Luiza se integrou à fabricante de fertilizantes Ourofertil em janeiro de 2020, após ter se aprofundado no tema sucessão em empresas familiares no seu trabalho deconclusão de curso (TCC). Misturar questões familiares com o negócio era algo que a incomodava, e o combinado foi tentar manter as barreiras intactas. “A partir do momento que entendi a dinâmica e passei a impor limites também para mim, as coisas começaram a fluir melhor. Hoje em dia é mais fácil discutir com meu chefe no trabalho e jantar em paz com meu pai em casa.”
A jovem entrou na operação sem função, mas foi criando espaços. Hoje é responsável por marketing e suprimentos especiais. A injeção de sangue novo na estrutura também levou a Ourofertil a olhar para pautas ESG, para que “seja uma empresa que olhe para os ‘stakeholders’ do início até o fim da cadeia de valor”, diz Luiza. A companhia passou a ser patrocinadora da escola de surf em Baía Formosa( RN), de onde saiu o medalhista de ouro olímpico Italo Ferreira.
O tema ESG é algo caro às novas gerações e permeou o treinamento do Citi, desde o espectro dos investimentos sustentáveis e de impacto, efetivamente, passando por filantropia e o investimento tradicional. O conteúdo das edições anteriores era mais técnico, pautado principalmente por tópicos financeiros, em que o Citi consegue agregar conhecimento aos participantes, diz André Cury, chefe da divisão de banco comercial. Com a covid-19 bagunçando a rotina de famílias e empresas, a decisão foi incorporar temas relacionados à inovação, e toda a adaptação necessária quando as pessoas foram para casa na fase mais crítica da crise sanitária, diz.
“Algumas empresas se tornaram realmente mais eficientes, automatizaram uma série de processos. Houve grande interesse por estudos de casos como o de uma varejista na China e muitas perguntas de como a juventude, os sucessores podem puxar o tema, dar o primeiro passo nas suas companhias em relação aos mais seniores ou aos fundadores”, afirma Cury.
Em três edições — não houve no ano passado por causa da pandemia —, o Citi já reuniu jovens de 75 empresas, representadas por 90 participantes. O banco não mede resultados do programa, a intenção não é monetizá-lo, diz Cury, acrescentando que o principal objetivo é construir relacionamento de longo prazo. A divisão de banco comercial trabalha em parceria com o private banking, a fim de capturar sinergias e negócios do lado empresarial e no aconselhamento financeiro às famílias. No corporate comercial, o Citi tem aproximadamente 1 mil contas, de empresas que faturam entre R$ 250 milhões e R$ 5 bilhões por ano.
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