Será que vale a pena você investir em fundos imobiliários para se aposentar?

Ativo atrai a atenção de investidores interessados em um ganho recorrente no longo prazo; especialistas divergem opiniões
Pontos-chave:
  • Com várias opções de investimentos, é possível juntar patrimônio com os fundos imobiliários
  • O ativo tem duas fontes principais: de retorno e de distribuição de rendimentos

Alcançar uma aposentadoria tranquila é um desejo unânime entre os brasileiros, mas pouco realista para quem for depender apenas da previdência social do INSS para sobreviver. Dada a necessidade de equilibrar as despesas fixas e os gastos com passeios, viagens e outros projetos pessoais, muitos buscam por produtos de previdência privada, os famosos PGBL e VGBL, como alternativa para se manter na terceira idade.

Mas com tantas opções de investimentos disponíveis hoje, é possível acumular patrimônio por meio de outros produtos financeiros, e os fundos imobiliários se destacam nesse aspecto, já que costumam remunerar os cotistas com pagamentos regulares.

Como funcionam os fundos imobiliários?

A categoria tem, basicamente, duas fontes principais de retorno para quem aplica: ganho de capital, por meio da valorização das cotas, e distribuição de rendimentos, também chamados de dividendos. Pela legislação, os fundos são obrigados a distribuir pelo menos 95% dos lucros a cada seis meses, mas a maioria opta por entregar mensalmente. Além desta regra, a lei também determina a isenção de imposto de renda em cima da rentabilidade entregue pelos fundos.

Por conta dessas características e vantagens regulatórias, Rodrigo Sgavioli, chefe da área de alocação e fundos da XP, acredita que os fundos imobiliários são excelentes instrumentos para quem deseja se aposentar ou ter uma renda complementar à do trabalho ou de outras fontes.

Pelo lado de quem já se aposentou ou está perto disso, o foco do investidor deve ser em ativos que gerem renda, e não necessariamente no ganho de capital. “Para esse público, a preocupação deve estar centrada em investir em fundos que têm um comportamento mais consistente de distribuição de rendimento vis a vis com os fundos em que a cota oscila muito”, explica.

A título de exemplo, no momento atual da economia, acrescenta, os fundos imobiliários de recebíveis, também conhecidos como “fundos de papel”, são os que estão se beneficiando do cenário de inflação e juros altos e, portanto, distribuindo maiores rentabilidades. Vale lembrar que, ao investir nessa subcategoria, o cotista não necessariamente se expõe aos imóveis diretamente, mas ao mercado de renda fixa imobiliária, por meio de títulos de dívida lastreados ao setor.

Fundos imobiliários são boas alternativas para os jovens?

Em relação à geração mais nova, que ainda está acumulando capital, ou seja, ainda está no mercado de trabalho e reserva uma fatia do salário para construir um patrimônio já pensando lá na frente, Sgavioli diz que os fundos imobiliários podem ser um caminho até o objetivo final.

No entanto, diferentemente da situação de uma pessoa prestes a se aposentar, na fase de acumulação o ideal é olhar mais para o ganho de capital do que para o rendimento mensal do fundo, uma vez que a valorização da cota vira, de certa forma, rentabilidade ao longo do tempo. “Isso porque o investidor mais novo pode cair na tentação de pegar o dinheiro dos dividendos mensais e, ao invés de reinvestir durante a acumulação, usar para gastar com outras coisas”, explica.

“Quanto mais ganho de capital na fase de acumulação, melhor”, reforça Sgavioli ao argumentar que, depois de alcançar um patamar de patrimônio investido que possa gerar um rendimento satisfatório, o investidor pode começar a migrar uma parte do dinheiro para fundos imobiliários mais focados em distribuir renda mensal.

Na mesma linha, Carlos Vaz, fundador da Conti Capital, pondera que alocar algo em torno de 20% da carteira em ativos imobiliários com foco em longo prazo pode ser uma opção até mesmo para uma pessoa mais jovem. “Temos que parar de pensar em deixar para guardar dinheiro só quando chegar perto da aposentadoria. Quem tem entre 25 e 30 anos já pode reservar uma parte da renda para investir pensando lá na frente. O fator multiplicativo é a grande riqueza do mercado imobiliário”, destaca.

Ativos imobiliários têm bons resultados?

Agora, pensando na perspectiva de retorno, pela valorização da cota ou pela distribuição de dividendo, Vaz pondera que vai depender da tese de investimento a ser seguida pelo investidor. “Se olharmos mais a longo prazo, vale pensar que a ideia é não usar o capital no curto prazo, seja ganho recorrente ou não. Então, eu prefiro ter um retorno mensal baixo e uma apreciação da cota maior, por exemplo”.

Antes de tomar a decisão de comprar algum fundo imobiliário, porém, é importante entender que o ativo faz parte da classe de renda variável, com cotação diária na bolsa, e, por isso, a cota pode oscilar para cima ou para baixo, mesmo que distribua bons rendimentos. Se a pessoa não tiver estômago para lidar com a volatilidade de preço da cota, diz Sgavioli, não é recomendável investir em fundos imobiliários pensando na aposentadoria.

Mas se ela entende que a cota oscila porque o mercado às vezes atribui um valor maior ou menor ao ativo, só que não necessariamente ele perdeu valor de fato, aí tudo bem. “É por isso que um bom planejamento financeiro é necessário para ajustar as diversas variáveis de investir para a aposentadoria”, destaca o profissional.

Uma parte dos investimentos

Para além do apetite ao risco, Vaz tem uma visão mais conservadora e faz uma breve comparação com o mercado americano, que tem uma posição muito forte no segmento imobiliário, chamado de real estate. “A posição média em real estate no portfólio dos investidores americanos é de 37%. Partindo desse ponto de vista, há de se considerar que se expor 100% é um excesso, mas uma posição de 25%, de repente, faz sentido no longo prazo”, explica. “Fundo imobiliário é um investimento muito bom para aposentadoria, mas prefiro ver como complemento da carteira e não como o todo dela”, acrescenta.

Ele chama a atenção para a importância de considerar que imprevistos podem acontecer a qualquer momento, como algo relacionado à saúde, e levar o investidor a precisar tirar o dinheiro de imediato. “É bom ter uma posição líquida, como dinheiro no banco, nem que seja 5% do patrimônio”, orienta Vaz.

Renda garantida?

Em relação à constância da distribuição de dividendos pelos fundos imobiliários, Marcelo D’Agosto, economista, ressalta que, no longo prazo, o fluxo de aluguéis dos imóveis pode mudar. Ele cita o exemplo das agências bancárias, que muitas pessoas achavam que era uma alternativa garantida para a aposentadoria, até que os bancos passaram a fechar os pontos físicos de atendimento. “O investidor de fundos imobiliários deve ter essa perspectiva em mente, sobretudo pensando lá na frente”, diz.

Conceitualmente falando, acrescenta, pode ser uma boa investir em fundos imobiliários para a aposentadoria, dada a importância do mercado imobiliário na economia real. O problema, no entanto, é o investidor achar que vai escolher um fundo e que vai receber rendimentos regulares por 30 anos. “O que parece é que, nesse período, as cidades mudam e os imóveis também. Então, eu acho que é um investimento difícil para um prazo tão longo”, defende o economista.

Em resumo, para D’Agosto, não é porque o produto paga dividendos mensais que ele necessariamente será bom para a aposentadoria, principalmente no caso dos fundos imobiliários que têm os imóveis por trás da operação e, em dado momento, podem deixar de receber e repassar o aluguel por algum motivo. “A não ser que o fundo garanta o pagamento de uma taxa de juros sobre um capital corrigido pela inflação”, conclui, ao lembrar que o Tesouro IPCA+, que paga juros semestrais, tem essa garantia e também pode ser uma alternativa para o objetivo da aposentadoria.

Como organizar a carteira?

O investidor que tiver interesse em comprar cotas de fundos imobiliários com foco na aposentadoria deve pensar na estratégia de diversificação entre os setores mais resilientes da classe, sustentam os especialistas. Sob este ponto de vista, Sgavioli, da XP, diz que os fundos do segmento de galpões logísticos possuem contratos mais longos e com empresas sólidas, o que acaba favorecendo a distribuição de dividendos.

Pensando em horizontes mais longos, orienta o profissional, pode ser interessante separar uma parte do dinheiro para se expor ao ativo real por meio de cotas de fundos de galpões, lajes corporativas e shoppings. A maior exposição, porém, pode estar centrada nos fundos imobiliários de recebíveis, que têm mais previsibilidade de distribuição de rendimento. “Eu tentaria ter, pelo menos, algo entre cinco e dez fundos imobiliários, a depender do volume de dinheiro, até para conseguir diversificar. E, partindo do número mínimo, por exemplo, três fundos seriam de recebíveis e os outros dois de tijolo”, pondera.

Ajuda de um profissional

Apesar de sugerir uma alternativa de balanceamento da carteira, o chefe de alocação da XP lembra que o universo de fundos imobiliários é extenso e, por isso, tomar as decisões sozinho pode ser uma tarefa difícil, principalmente quando se tem um objetivo de longo prazo. Além da ajuda com o planejamento financeiro e a estratégia de investimento, o ideal é que o investidor possa contar com um profissional para auxiliar na hora de escolher os fundos que vão compor a carteira.

Para Vaz, teses de investimentos que tenham uma demanda independente do mercado também devem estar no radar de quem tem interesse em investir em fundos imobiliários. Um exemplo é o setor residencial que, mesmo recente por aqui, tende a se manter forte mesmo em um momento de crise, dada a necessidade de moradia. Do outro lado, mas com maior cautela, o fundador da Conti Capital compartilha da mesma visão de Sgavioli e aposta no segmento de galpões logísticos.

“Outros setores, como hotelaria e lajes corporativas, já acho mais complicado porque oscilam bastante. A pandemia, por exemplo, ninguém imaginava que poderia acontecer, mas provamos do impossível. Agora, imagina que isso se repita no futuro?”, avalia Vaz, que em seguida sugere que o investidor não precisa ter apenas um fundo imobiliário na carteira, mas também não precisa ter dez.

Quem tiver o interesse em diversificar o capital investido para aposentadoria e estiver disposto a olhar para os investimentos lá de fora, o Real Estate Investment Trust (REIT) também pode ser uma opção para o portfólio. O REIT, que influenciou na criação do nosso fundo imobiliário, nasceu nos anos 1960 nos Estados Unidos e corresponde hoje a um mercado de mais de um trilhão de dólares.

“Vale a pena investir em REIT porque o investidor brasileiro passa a ter uma posição a uma moeda estrangeira que independe da economia e da política brasileira”, defende Vaz. Ele complementa que, pelo lado da diversificação geográfica, faz sentido o investidor reservar nem que seja 5% do capital da estratégia de longo prazo para aplicar em REIT.

Apesar de se tratar de um investimento feito no exterior, o investidor que preferir não arcar com as questões tributárias um pouco mais burocráticas de transferir dinheiro lá para fora consegue se expor ao produto internacional por meio de fundos de investimentos. Além deles, também é possível investir por meio de recibos de ações (BDRs) e de fundos de índice (ETFs) na B3, que demandam um valor menor para investir e, por isso, são mais acessíveis ao investidor pequeno.