Fator Marina? Gestores apontam que ativos ESG podem valorizar

Novo governo deve trazer bons resultados para a economia sustentável

O consenso entre gestores e agentes do mercado financeiro que investem em fundos relacionados à agenda ESG é de que o governo Bolsonaro tem uma gestão desastrosa sobre a preservação ambiental.

A imagem do governo Bolsonaro foi tão ruim, que a simples boa vontade do presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva (PT) já basta para destravar investimentos internacionais no Brasil.

Por isso, a ida de Lula à COP27 fez com que Noruega e Alemanha retomassem os investimentos no Fundo Amazônia, após a redução de novos aportes durante o atual governo.

Investidores, diretores de investimento e o setor de venture capital estavam avessos a desbravar o risco Brasil.

Mas a maré virou antes mesmo do novo governo assumir.

Nesse caso, o fator Marina importa pouco, porque a simples mudança na troca da Presidência deve trazer mais investidores verdes ao Brasil.

Por que Lula atrai capital estrangeiro?

A faixa presidencial nem passou do incumbente ao eleito e o clima no mercado de investimentos verde já melhorou.

Na visão de gestores de ativos ESG, como de fundos florestais e de créditos de ambientais, Lula tem o “goodwill” com o investidor internacional na área ambiental que falta a Bolsonaro.

“A abertura do Brasil é fundamental para aumentar o fundo de capital em ESG”, diz Danilo Zelinski, gestor da KPTL e diretor do fundo Floresta e Clima da empresa. “Tirar o medo político do investidor sobre o Brasil é uma ótima notícia. Nesse caso, temos que atrair capital para uma economia mais verde, com investimento a ser feito em tecnologia para criar escalabilidade, levando a projetos mais viáveis”, explica Zelinski. Há 12 meses, diz ele, conversas com investidores internacionais terminavam em frustração.

Exemplo de fundo

Por exemplo: a KPTL criou seu fundo de Floresta e Clima em junho de 2021.

A gestora tem patrimônio de R$ 1 bilhão em nove fundos de investimento, e espera captar mais R$ 200 milhões em venture capital nos próximos 12 meses.

Neste caso, o foco, diz Zelinski, é acelerar projetos de descarbonização de indústrias, biotecnologia e economia circular.

Em que o mercado está de olho

Sócio-fundador e CIO da Empiricus Investimentos, George Wachsmann explica que a postura do presidente eleito nem é tão impactante.

O que mais importou para o mundo dos investimentos em ESG foi o simples sinal da guinada na gestão ambiental.

“Talvez a imagem do governo atual tenha sido excessivamente negativa. A anormalidade no tratamento do meio ambiente foi tão grande que quem demonstra ir na direção oposta é visto com bons olhos”, diz Wachsmann. “Portanto, é mais demérito do atual governo do que do governo eleito”, afirma o gestor.

Para ele, o Brasil tem potencial para explorar projetos ambientais principalmente na área de biocombustíveis.

“O país tem uma estrutura inovadora de etanol — alternativa ao etanol americano — que não tem o espaço que deveria ter, especialmente se levarmos em conta a Guerra na Ucrânia e a restrição de oferta internacional de combustíveis”, completa.

Marina traz credibilidade, dizem gestores

A possível indicação da deputada federal eleita Marina Silva (Rede-SP) para o Ministério do Meio Ambiente é bem-vista pelo mercado, porque ela daria mais credibilidade ao setor.

Os gestores afirmam que Marina é uma representante de peso, mas que a volatilidade nos investimentos ESG dependerá da postura da ministra ou ministro que vier a ocupar o cargo.

O papel de órgãos federais de financiamento de fiscalização do mercado mobiliário também são importantes e podem se somar aos esforços do Ministério do Meio Ambiente, aponta Zelinski, da KPTL.

Para ele, o BNDES terá papel central em promover uma economia mais verde.

Afinal, o banco estatal de empréstimos e crédito tem programas de concessões de parques públicos e fez duas chamadas para editais de compra de créditos de carbono. A CVM, por outro lado, também será importante para regular o mercado de fundos de créditos ambientais.

De acordo com Piero Minardi, presidente da ABVCAP (Associação Brasileira de Venture Capital e Private Equity), a postura do próximo ministro ou ministra do Meio Ambiente deve ser a de planejador, de estrategista.

“O novo ministro vai precisar arrumar a casa da bagunça deixada pela gestão anterior. Além disso, será necessário construir uma agenda do Brasil como potência verde. Nesse caso, precisamos aproveitar mais o nosso turismo ecológico, monetizando a atividade sem destruir o meio ambiente”, diz Minardi.

Ratings de empresas latino-americanas estão melhores

A nova gestão do meio ambiente no Brasil pode trazer bons resultados para os investimentos em economia sustentável.

A Compass Group, gestora focada em capital para empresas da América Latina, tem estimulado seus investidores, principalmente os de private equity, a virem para o Brasil.

Por quê? Antônio Miranda, CIO e sócio da Compass, explica: “As empresas da América Latina estão crescendo. Elas estão aderindo às melhores práticas em ESG, consolidando uma melhoria geral nos ratings”, diz o gestor.

Tanto que os fundos geridos pela Compass na Europa estão migrando para a regulação da União Europeia que torna obrigatória a oferta de produtos com impacto social e ambiental.

A perspectiva é de que o fundo de créditos em ESG da Compass acompanhe esse crescimento. A gestora tem sob administração um patrimônio de US$ 35 bilhões, atuando em sete mercados da América Latina, além dos Estados Unidos. São cinco fundos no Brasil, com quatro focados em crédito e um em ações na bolsa de valores.

A Compass usa alguns critérios para os ratings em empresas brasileiras nas quais investe.

O primeiro é a exigência do ‘net zero’, ou seja, zerar emissões de gases estufa a longo prazo.

“Nossa investida é sobre altas emissoras de gases estufas. São empresas que emitem o equivalente a mil toneladas de gases a cada US$ 1 milhão de receita, medida que a Compass considera intensiva”, explica Antônio.

Investidor brasileiro está mais interessado no ESG

O próprio investidor brasileiro está mais interessado na tendência ESG, apontam os gestores entrevistados pela Inteligência Financeira.

Se em 2020 a postura do mercado frente a títulos verdes era mais tímida, neste ano a discussão em torno dos riscos para investir em créditos ESG avançou e está mais madura.

“Os grandes investidores e bancos de investimento criaram suas áreas ESG. As corporações e fundos de pensão também estão engajados e investindo nessa agenda”, pontua Danilo Zelinski.

O peso dos estrangeiros no ESG

A onda verde internacional acompanha um cenário favorável para investimentos no Brasil.

Empresas estrangeiras representaram 11% das vendas no mercado nacional, ao mesmo tempo em que o país foi o sexto destino mais procurado para investimento estrangeiro direto. Foram US$ 50 bilhões vindos do exterior alocados no Brasil em 2021, informam dados da ABVCAP.

Piero Minardi explica que o agronegócio pode assumir posição de liderança nos próximos cinco anos, pelo menos para investimentos de private equity.

Esse protagonismo, no entanto, não será imediato.

Investimentos em private equity, explica o presidente da ABVCAP, são de longo prazo, especialmente no setor ambiental.

O tempo para tornar o aporte rentável pode variar a depender do projeto e da empresa, mas geralmente é de 4 a 8 anos.

Capital verde é intensivo, mas de longo prazo

“No fundo, os setores de crédito de carbono e energia limpa são de capital intensivo e ciclo longo de maturação. Há demora para se pagar, mas esse é o tipo do capital sustentável”, destaca Minardi, apontando que os investimentos são cíclicos

“As empresas mais tradicionais captam recursos para financiarem projetos de 4 a 5 anos. Isso porque fábricas verdes, usinas solares, plantações sustentáveis demoram para serem erguidas. Ao fim destes projetos, elas fazem mais rodadas, gerando um círculo virtuoso. É melhor para o investidor, porque ele fica mais empenhado.”