Você sabia que o estágio do imóvel pode mexer com os seus investimentos?

Veja se é melhor investir na fase de incorporação ou quando o imóvel já está pronto
Pontos-chave:
  • Fundos imobiliários remuneram com os aluguéis ou pela valorização das cotas
  • Já o lucro da cota de empreendimento vem do resultado financeiro e da margem obtida pela incorporadora

A taxa de juros em 2% ao ano em 2020 foi um fator importante para muitos investidores migrarem de opções mais conservadoras de renda fixa para a renda variável, como os fundos de investimento imobiliário (FIIs). O movimento de alta Selic a partir de abril de 2021, porém, impactou de diversas maneiras o desempenho dos produtos da modalidade ligados ao setor imobiliário.

Mas há pontos importantes a se conhecer na hora de buscar por opções de investimento que envolvam imóveis. Por exemplo: é melhor entrar em uma fase de incorporação imobiliária correndo um risco potencialmente maior (vendas, construção, financiamento) ou alocar recursos em uma fase em que o imóvel está pronto, com retorno mais previsível, mas também dependente de fatores como a locação do imóvel?

O Valor Investe reuniu algumas informações sobre FIIs e cotas de empreendimento imobiliário para ajudar na tomada de decisão, especialmente dos investidores mais iniciantes. Isso porque, embora os dois sejam ligados a imóveis, as lógicas riscos e retornos esperados são diferentes.

Cotas via empreendimento imobiliário e via fundos

Dentre as opções de cotas de empreendimentos imobiliário, as mais conhecidas são aquelas emitidas pelas construtoras antes do pré-lançamento do projeto de incorporação. As cotas podem ser disponibilizadas via fundos negociados na Bolsa de Valores ou fora do ambiente de bolsa, diretamente com a incorporadora.

“Quando o imóvel está na fase de planejamento e incorporação, ele depende de muito investimento, mas sem tanto resultado imediato ao investidor. O objetivo está em obter um resultado expressivo com a venda do imóvel”, explica Fábio Carvalho, sócio da Alianza Gestora. Para ter acesso, o investidor precisa criar conta em uma corretora e executar ordens de compra para as opções de seu interesse. Em geral, esses fundos imobiliários concentram investidores profissionais e estrangeiros, que aportam grandes volumes de recursos para o desenvolvimento da construção.

Quando comprar cotas de um fundo imobiliário?

Algumas construtoras de menor porte também vendem cotas, mas diretamente ao investidor. Dentro dessa proposta, há variações. Em um dos modelos, uma das incorporadoras do mercado propõe a entrada do investidor apenas quando a construção já está em curso. Toda a compra do terreno, a aprovação do projeto e o início da obra é realizada com recursos da empresa. As cotas se limitam a financiar, no máximo, 40% do empreendimento já de olho na finalização. Em geral, cada projeto tem, no máximo, 50 apartamentos.

“O investidor já entra com o processo todo aprovado e adiantado desenvolvimento, o que traz mais segurança para ele. Diferentemente de outras construtoras, os nossos projetos são desenhados para a venda ser concluída em até 30 meses após a entrega”, diz Jonata Tribioli, diretor comercial da NeoIn, construtora e incorporadora.

Cota fica mais cara?

A proposta pode gerar uma dúvida: a cota não fica mais cara para o investidor? Segundo o executivo, o cotista paga o preço de custo e não o preço do metro quadrado negociado no mercado pelo futuro morador. “Os custos com alta da Selic e o impacto do preço dos materiais de construção são pagos pelo cliente final, que vai adquirir a unidade. Como são prédios menores, o risco de demorar a vender também é menor”, afirma.

Em quais cotas investir?

Ele ainda explica que o cotista não precisa adquirir uma unidade específica. É possível alocar recursos em diferentes empreendimentos da carteira da construtora. Nas rodadas de investimentos são apresentados os riscos, quais os empreendimentos, e a taxa de venda de cada projeto. O acordo é formalizado no modelo de sociedade em conta de participação (SCP). Neste instrumento previsto no Código Civil, a empresa responsável pelo projeto entra como sócia, recolhendo os impostos sobre o total do empreendimento. Já o investidor se torna um sócio oculto do negócio.

Perda limitada ao valor investido

Na visão de Thaís Gurjão, advogada do escritório VBSO Advogados, a SPC é a ideal “‘quando o investidor quer aplicar capital em empreendimento específico com limitação do risco. Como, na pior das hipóteses, a perda será limitada ao valor investido, o investidor não tem obrigações adicionais da atividade empresarial em si. Também é muito comum que o investimento via SCP seja utilizado para permuta, ou seja, a receber unidade do empreendimento em troca do aporte”, explica.

A advogada esclarece, no entanto, que a SCP gera responsabilidade ao investidor caso ele tenha interferido nas atividades da sociedade ou do sócio responsável pelos acordos (chamado de ostensivo).

Como é feita a remuneração ao investidor?

Um dos pontos que mais gera dúvida na comparação entre essa modalidade das cotas e a de fundos imobiliários que também se voltam para imóveis residenciais (há fundos que investem em lajes comerciais, galpões, shoppings) é a remuneração ao longo do tempo.

Embora o lastro possa ser parecido, as mecânicas são diferentes. Os fundos imobiliários negociados na Bolsa de Valores remuneram os investidores com os aluguéis (quando os imóveis já estão prontos), ou pela valorização indireta das cotas, e costuma ter liquidez maior.

Foco na remuneração em pouco tempo

Além disso, uma mudança recente na oferta dos produtos foca cada vez mais em quem busca por remuneração em menor tempo. “Grande parte dos fundos passou a ser de imóveis prontos para locação, que rapidamente geram retorno ao investidor. A renda é gerada tanto pelos aluguéis quanto pela eventual aquisição de novos imóveis para serem revendidos. Em suma, são fundos de renda mensal e recorrente, isentos de imposto de renda.”, explica o gestor da Alianza Gestora.

Já o lucro da cota de empreendimento imobiliário vem da apuração do resultado financeiro total do empreendimento, então depende do chamado “VGV” (valor geral de vendas) e da margem obtida pela incorporadora no projeto. Mais do que uma renda recorrente, portanto, a ideia aqui é ter ganho de capital em troca de ter adiantado o dinheiro da construção (imóveis prontos costumam valer mais do que na planta) e virar sócio da construtora naquele negócio específico. Segundo a incorporadora Neoin, também é possível a antecipação mensal de lucros durante o período de contrato.

Quais são os riscos de cada modalidade?

Como qualquer tipo de investimento, há riscos em ambas as propostas. Entre os pontos que afetam diretamente o rendimento dos cotistas, no caso dos fundos imobiliários de tijolo, estão a oscilação no preço das cotas, o risco de desvalorização do fundo, além do risco dos imóveis ficarem desocupados e ocorrer inadimplência de condomínio.

“É importante o investidor saber quais os critérios que tornam elegíveis os imóveis que formam a carteira do fundo, como restrições à localização e histórico de inadimplência e vacância. E também saber se há mecanismos para substituição dos imóveis mais críticos”, orienta a advogada Thaís Gurjão.

Fábio Carvalho pondera que, apesar de os riscos serem similares ao do investimento em um imóvel direto, os custos de uma unidade são diluídos frente a diversificação que o fundo permite. “Como há vários imóveis no fundo, se algum demorar para ser locado, o peso do IPTU e do condomínio, por exemplo, acabam não sendo tão significativos”, sustenta.

Há outras questões importantes, segundo Thaís Gurjão. “Os cotistas de FII têm apenas direito a rendimentos, não têm poder de decisão sobre a composição do portfólio do fundo. Se o fundo for destinado a investir em contratos com locatários específicos, é importante entender os riscos associados. Por isso, vale entender exatamente o tipo de fundo que está sendo buscado”, complementa. Um exemplo do que pode afetar a ocupação e os rendimentos do FII é a liquidação extrajudicial de uma determinada locatária.

No caso da incorporação imobiliária direta via cotas, os riscos de a obra não sair, atrasar ou, no pior dos cenários, a construtora quebrar são os piores pesadelos do investidor e do futuro morador. Conforme Tribioli, da NeoIn, “em último caso, a própria empresa recompra as unidades, se as aquisições não se concretizarem. Como o terreno é próprio, a área também é uma segurança para restituir os cotistas, diante de uma eventual quebra da construtora”.

Como a alta da Selic impacta nos FIIs

O impacto da alta da taxa de juros também tem suas particularidades. No ano passado, os “dividend yields”, distribuídos mensalmente pelos fundos que integram o Índice de Fundos Imobiliários da B3 (Ifix), foram superiores a Selic. Cerca de 90% dos 103 fundos imobiliários ofereceram retorno com dividendos superior ao retorno médio obtido diretamente com a locação de imóveis. Ainda assim, desde o segundo semestre, com a sinalização de mudança rápida na política monetária, as cotas dos fundos imobiliários caíram, em média, 2,2%.

“O rendimento vindo de aluguéis é relativamente fixo e com a taxa de juros subindo, muita gente decidiu pela venda para buscar a rentabilidade que a renda fixa estava trazendo. Agora, a expectativa é de reversão. Num cenário de juros caindo, o investidor vai buscar as melhores alternativas”, pontua o sócio da Alianza Gestora.

Ao mesmo tempo, a aposta diretamente nos imóveis no atual patamar da Selic testa a paciência do investidor frente ao interesse da demanda final, que encontra o crédito imobiliário mais caro em caso de financiamento, como também diante da oferta de novos lançamentos para investir.

Vendas de imóveis estacionou

Dados da Câmara Brasileira da Indústria da Construção (CBIC) mostram que os lançamentos e vendas de imóveis residenciais estacionaram no trimestre, sob o impacto da inflação, perda do poder de compra, aumento do preço dos insumos da construção civil, e da falta de confiança dos empresários no segmento. O programa Casa Verde e Amarela (CVA) se destaca negativamente, com perdas ao longo dos últimos trimestres.

“A Selic a 12%, 13% não é boa para o mercado como um todo. Mesmo que chegue em 8% em 2023, ainda vai trazer desafios. Mas o nosso cotista sente menos o impacto porque, mesmo com o crédito imobiliário mais caro, a quantidade final de unidades a ser vendidas é menor”, defende Triboli.

Ao apostar em projetos com essa característica e que focam na parcela que tem intenção de compra nos próximos doze meses, a incorporadora diz que consegue pulverizar os empreendimentos nas regiões com maior interesse e demanda habitacional, especialmente dentro dos valores praticados do CVA.

“Muitas vezes, o investidor leva um ano e meio para aderir, mas o número de cotistas está aumentando porque o valor está mais acessível. Em nosso modelo, a entrada acontece a partir de R$ 10 mil”, argumenta.

Apesar da entrada no segmento de FIIs já ser mais acessível do ponto de vista de volume desprendido – há fundos de aluguéis em que o aporte inicial é de R$ 100, por exemplo -, a decisão também precisa ser bem pensada, a exemplo das cotas. “É uma adesão que deve considerar o longo prazo, como todo investimento de renda variável. É preciso saber aproveitar quando algo está barato no curto prazo para comprar”, reitera Fábio Carvalho, da Alianza.

O desempenho do Ifix reforça a visão de médio e longo prazos que deve prevalecer entre os investidores de fundos imobiliários. Em 2021, a rentabilidade média do indicador ficou negativa em 2,3%. Em uma década, o referencial do segmento exibe um retorno nominal acumulado de 180,48%. No mesmo período, o Ibovespa subiu 51,25% e o CDI somou ganho de 148,85%.